segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Florestania hippie

Moisés Diniz

A florestania hippie enxerga a cidade como o inferno de Dante e sonha acolher na floresta os seus ex-cidadãos. Uma visão romântica e inviável, pois a florestania real, que vai sendo testada no Acre, olha o homem e a floresta como entes inteiros.

A florestania que se desenvolve no Acre, de forma inédita, está sendo capaz de aumentar o PIB e a renda per capita sem destruir o patrimônio natural, de construir espaços urbanos bonitos sem poluir os rios, de erguer obras vistosas sem acossar os animais da floresta, os pássaros, de levantar grandes pontes e até de cobrir o solo com asfalto sem comprometer o futuro, sem agredir o verde que sempre foi o dono do lugar.

Aqui no Acre, essa menina completou 11 anos e pouco tem se falado sobre ela. É preciso analisar esse tempo pré-adolescente e descobrir o que de sol ela trouxe e o que de noite ela não conseguiu levar ao amanhecer. Mais gente precisa discutir os seus rumos e até o que significa florestania.

Quando defendemos a florestania como um conceito que pode interferir na vida das pessoas, nós acreditamos que seu campo de ação não deve ficar restrito à floresta. Ela deve vencer os cipoais, cruzar os varadouros e emergir dos seus lagos encantados e sombrios.

A florestania é o homem vivendo a plenitude de seus direitos civis e sociais na floresta. Durante um século, o tempo de nossa existência como acreanos, fomos preconceituosos com a floresta, interditamos a sua beleza e cultuamos o concreto e as bugigangas culturais européias.

Aqui fomos tão longe no embrutecimento de nossa memória e no extermínio de nossas raízes que, somente em 1970, o estado do Acre reconheceu oficialmente a existência de povos indígenas em seu território.

Chegamos ao ridículo de construir nossas moradias de costas para o rio, como se ele e suas águas, seus peixes e seus encantos nos envergonhassem. Travamos a nossa língua e escondemos a sintaxe cabocla da floresta profunda. Anulamos as nossas origens.
Ocorre que aqui tudo é floresta. Somos apenas 22 clareiras no meio da imensa floresta de árvores, animais, lagos, insetos, peixes, pássaros e larvas. Em nenhum lugar urbano do Acre andamos mais de 20 km para encontrar a floresta.

Estamos tão próximos da floresta que, muitas vezes, nos comportamos como os animais ou os insetos que estão no seu interior. Quantas vezes nos comportamos como a cotia, a roubar a mandioca dos roçados próximos ou como as formigas que erguem o barro coletivo e a solidariedade.

Somos um imenso oceano de árvores e toda beleza natural que brota no seu entorno, um jardim de Éden, apesar dos piuns e das muriçocas. De Mâncio Lima a Assis Brasil são 153 mil km* de florestas profundas, a proteger 21 pequenas cidades e a capital que, juntas, mal ultrapassam o meio milhão de habitantes.

Assim, devemos olhar a florestania como um conceito integral, que proporcione vida digna ao acreano na moradia, no alimento, no vestuário, na escola, no transporte, na cultura, no lazer e no hospital, quando adoecer.

Aqui reconhecemos que esse conceito, transformado em política de governo, evitou a morte de milhares de hectares de floresta, sustou a matança de milhares de espécies vivas e evitou a descarga de milhares de toneladas de carbono. Aonde foi possível ergueu belos espaços urbanos de lazer e de cultura e suavizou a paisagem com amplas e belas avenidas. Ergueu escolas aprazíveis e modernos hospitais.

Mas, não atingiu ainda o coração privado. O transporte coletivo ainda é de tirar a paciência de qualquer um que o use e as nossas construções não levam em conta uma arquitetura verde e o clima chuvoso da Amazônia.

Não tem explicação nossos prédios não permitirem abrir as janelas durante as chuvas, que são constantes durante 8 meses do ano, o que reduziria o custo da energia elétrica e combateria o aquecimento global.

A nossa arquitetura amazônica deve ser verde, capaz de aproveitar as correntes frias do ar da chuva e permitir formas mais modernas e futuristas de aproveitamento da luz do sol.

Não podemos pensar numa sociedade sustentável se os lugares aonde as pessoas vivem, trabalham e estudam não forem erguidos sob os paradigmas de uma arquitetura verde, sustentável.
Se fomos capazes de criar um conceito inédito e de torná-lo política de governo, devemos usar da mesma engenharia criativa para constituir uma arquitetura verde e um transporte coletivo que seja modelo para o Brasil.

Além dos prédios e dos ônibus, como símbolos da sustentabilidade coletiva e do avanço das condições materiais, precisamos levar a florestania aos corações humanamente partidos, às almas contrariadas e aos lugares mais defeituosos da condição humana.
Aonde houver um acreano doente, seja no corpo, seja na alma, precisamos alcançá-lo, erguer a sua auto-estima e entregar-lhe a esperança de um abraço irmão. Do contrário, será como se estivéssemos a erguer praças e esquecendo das crianças que não conseguem brincar ou sentar nos seus bancos.

A florestania deve atingir toda a condição humana, iluminar todos os espaços, fortalecer todos os laços, anistiar o contraditório e sepultar o preconceito contra a floresta e os homens pobres. Ela precisa unir a floresta aos espaços e entes urbanos.

A florestania que defendemos é completa, é florestal, é urbana, é moderna, é humanista, é fraterna e tem no homem amazônico a sua grande aposta. Por isso, ela precisa estar cada vez mais perto do povo, acolher mais o contraditório e ouvir mais a academia, as aldeias, a intelectualidade e as ruas.

Moisés Diniz é professor e deputado estadual pelo PCdoB do Acre.

sábado, 26 de dezembro de 2009

Manoel Moraes assume cadeira na Assembléia

Com informações da Aleac

Na presença de familiares, muitos amigos e colegas de partido, Manoel Moraes de Sales (PSB) assumiu na tarde da última quarta-feira, 23, uma das cadeiras de deputado estadual do Parlamento acreano numa cerimônia em que foi empossado pelo presidente da Aleac, Edvaldo Magalhães (PCdoB).

O novo parlamentar nasceu no seringal Oriente, uma localidade próxima da Vila Extrema, no município de Rio Branco. Tem 46 anos, é casado e tem um casal de filhos e afirmou que as expectativas são muito boas em relação ao mandato que acaba de assumir. "Tenho muitas idéias que podem ser debatidas e contribuir com a sociedade acreana e vou colocá-las mesmo nesse curto período em que estiver nesta Casa para que esse debate seja feito", declarou.

Moraes obteve 3.434 na última eleição para deputado estadual realizada em 2006, pela coligação PSB - PRTB, somando 1,07% dos votos válidos. Ele destacou que está satisfeito com o fato de estar assumindo o mandato e afirmou. "Cada um desses votos que me foi confiado foi muito importante para que eu conseguisse chegar até este momento".

Há quatro anos no partido, Moraes integra a Frente Popular desde o seu início quando ainda fazia parte do PDT. Naquela época, participou de um grande comício realizado em Tarauacá, local onde morou por seis anos e quando a agremiação começava a se formar. Também residiu em Xapuri, onde fixou moradia por 18 anos.

Manoel Moraes assumiu no lugar do deputado Delorgem Campos (PSB), que pediu afastamento de 121 dias por motivo de tratamento de saúde.

Fonte: jornal O Rio Branco.

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Bodão



Do jornal A Gazeta

Uma história de 13 anos no Vale Tudo, o xapuriense Francimar Bodão está bem perto de “começar a galgar o sonho de lutar no Japão”. Seu “ingresso” para a competição que é prestigiada por milhões de pessoas em todo o mundo, foi conquistada durante o Bitetti Combate MMA, no último dia 12, em São Paulo/SP.

Nos últimos 12 meses, o atleta acreano lutou seis vezes, invicto em todas elas, motivo de comentário positivo durante a transmissão na Sportv e no canal Combat. O mais impressionante foi que todas as lutas foram vencidas no 1º round, inclusive o paulista Alessandro.

“A luta valia o passaporte para quem conseguiria lutar no Japão ou Estados Unidos e consegui”, desabafou Bodão. O xapuriense foi contatado pelos empresários André Pederneira e Joinha para antecipar suas férias, programadas para três semanas, mas foi antecipada em uma semana.

“Tenho que começar os trabalhos visando a luta em fevereiro, no Japão”, afirmou. Atualmente Bodão vem treinando na academia Riva Fight Team, sob a coordenação do professor Rivelino.
Nesta temporada, Bodão lutou em Manaus/AM, Belém/PA, Rio de Janeiro/RJ e São Paulo/SP.

“A preparação para conseguir bons resultados tem que ser forte, com a seleção brasileira de luta livre, na equipe do Pedro Rizo no Muay Tai, o boxe é com dois cubanos, e o jiu-jitsu, na academia Delfino Tijuca, na zona Norte do Rio de Janeiro”, explica. Além destas modalidades, o xapuriense ainda treina com o acreano Marquinhos, preparador físico da seleção brasileira de judô, tornando ainda mais intensa a questão física.

Sem ser rogado, quando indagado sobre a próxima meta, Bodão afirma: “quero ser campeão do UFC, mesmo sabendo que estarei lutando contra os melhores do mundo, não vou me intimidar, pois estou pronto para isso”. Apesar de não estar recebendo os cachês milionários que os melhores do UFC recebem – em torno de R$ 500 mil – o acreano lembra que no caminho da vitória passou muita necessidade. “Mesmo tendo que me alimentar bem, cheguei a ter só o básico e enfrentar adversários que tinham tudo”, lembra. Agora o objetivo é figurar entre os grandes atletas da região Norte, ao lado de Lyoto, Jacaré, entre outros.

Bitetti – Passaporte para o UFC, o Bitetti Combat MMA vem sendo realizado nos principais centros do país. Os organizadores confirmaram que pretendem realizar no Brasil inteiro, inclusive no Acre, onde os contatos já começaram a serem mantidos. A meta é, em quatro anos, passar por todos os estados.

Feliz Natal!

Moisés Diniz

Fico impressionado com o comportamento das pessoas nestes dias de resguardo de Natal e aguardo de Ano Novo. É como se uma luz incandescente emergisse de cada veia e de cada neurônio. É um espetáculo o que acontece no cérebro de cada pessoa.

As pessoas ficam mais alegres, acreditam mais, reduzem os seus medos. Acreditam que o 13º salário vai quitar todas as dívidas e que, de uma hora para outra, a vida vai ser bem melhor no ano que vai nascer.

Aquele que te fez sofrer aperta a tua mão e tu respondes com ternura ao mesmo aperto de mãos. O carrasco que te algemou recebe um abraço teu, mesmo que não tenhas mãos.

O menino da periferia, de cor negra e já sem dentes básicos, aguarda inquieto aquele embrulho que vai lhe trazer alegria. O seu pobre pai, alcoolizado na esquina, não percebe o tamanho do sonho do filho. E se percebe se alcooliza para não perceber.

A menina adolescente acredita que são verdadeiras aquelas palavras lindas que ouviu no celular, que só liga a cobrar, e que não vai demorar a chegada daquele príncipe encantado.

Ela não sabe que aquele calhorda quer apenas se aproveitar de sua carne tenra. Que do outro lado da vila, da vida, da palafita ele dorme numa mansão inconsolável e que o seu sonho juvenil vai acordar com os gritos da primeira briga de rua do ano.

O dono do boteco na ponta da rua acredita que todo o bairro esquecido pelos homens do poder vai se lembrar de quitar as suas dívidas. Ele sonha encher, no ano que vem e que chega sob as primeiras luzes e nos mais sutis apertos de mão, as prateleiras com mais feijão e açúcar, bolacha, sardinha e arroz, palito de fósforo, pouco papel, goiabada e cibalena, muito sal, farinha e pão dormido, lâmina de barbear semanal.

O homem do boteco é como a gente que vende sonhos a prazo, não exige assinatura, não cobra a fatura e nem digital. Tudo fica aguardando o Natal, o Ano Novo que vai chegar como búfalo, locomotiva e temporal.

Esses dias especiais vão trazer de volta o meu emprego, a minha alegria, o meu pão, a mulher perdida, a conta esquecida que o vizinho não pagou. Vai ter leite em toda mama, vergonha em todo homem, beleza em toda dama.

Não serei mais tão estúpido a ponto de não perceber os olhares do povo que exige mais abrigo, escola e pão. Vou abraçar o amanhecer e ver que a vida não passa de um pedaço do universo que também se partiu.

Verei que a felicidade humana é como um pouco de carne na boca sempre faminta de um rico qualquer. E que cada um alimenta o seu animal a partir do tamanho da alma do seu próprio dono.

Por isso me incomodam esses abraços, que parecem laços, pedaços de sonhos que não vão se realizar, como se uma serpente engolisse a outra que também lhe quer bem.

Neste Natal as serpentes de cada mente humana vão abraçar as outras serpentes. Será um abraço de quem come e dorme, veste e acorda a custa do trabalho humano, dos outros trabalhos que não são os seus.

Neste final de ano incerto eu vou abraçar meus amigos que ainda não conheci. Pois sei o quanto é fácil abraçar o meu irmão, minha filha, meu parente. Como abraçar os que choram nas ruas nas quais eu não ando, nas periferias que me fazem medo?

Como dizer ‘Feliz Natal’ para quem não nasceu e ‘Feliz Novo Ano’ para quem envelheceu? Por que abraçar as serpentes que cultivamos e fingir que não vemos a dor que elas produzem lá mais distante, onde meus olhos não alcançam, minha solidariedade não atinge e minha voz não leva nenhum acalanto?

Um Natal assim me deixa doente, é como uma doença antiga, do tempo em que o meu coração se partiu em três, quatro pedaços colossais, a amar meus desejos pequenos e a esquecer os desejos gigantes da humanidade.

Queria um Natal diferente, onde o homem amasse de fato a si mesmo e aos outros. Que as árvores não fossem sufocadas pelos coronéis do carbono, nem as águas, nem o ar, nem as larvas, nem as sementes, nem os pássaros sadios, os doentes, nem as raízes, nem os lagos, nem os homens, nem os peixes, nem os animais de pele, de escama, de asas, nem as lagartas, nem a terra.

Nenhum pedaço de sol eu posso dar, nenhuma esmola que não agüenta uma investigação. Por isso eu vou proteger o sol neste Natal, a única beleza natural que eu posso cuidar. Abraçar a lua não me deixará em conflito com os donos do poder.

Acho que vou acabar abraçando a chuva aqui nesta Amazônia indecente, que fica nua nas aldeias indígenas e não se preocupa com a cretinice dos apóstatas do verde e apóstolos do medo e da moral divina.

Vou abraçar o vento, vou falar com os pedaços soltos de asfalto, porque sei que eles são restos mortais milenares de nossos antepassados, de nossas árvores, animais, tudo que se acumulou no subsolo invisível do planeta. Com eles conversarei.

Pedirei perdão aos entes da floresta, aos meninos pobres e às adolescentes convertidas à prostituição, aos desempregados do capital, aos negros, aos povos indígenas, aos homossexuais, aos africanos, palestinos, aos latinos e iraquianos.

Feliz Natal ao homem das margens dos igarapés amazônicos, às mulheres que não lhe deram a oportunidade de pintar o cabelo, os lábios, usar um bracelete, um vestido de moda, aos pássaros que não se vestem contra o frio ou para adornar a noite.

Lutarei contra os meus medos e as minhas antipatias ao novo, ao desconhecido e a tudo aquilo que maltrata e provoca dúvida, preconceito e aversão. Uma idéia nova, uma pessoa doente, sem lar e esperança, uma nódoa na minha blusa de linho, um desvio no meu caminho, um medo de repartir, de amar.

Feliz Natal aos homens de sonho nobre, de idéias encantadas e coletivas. Que cada silêncio de rua faça nascer uma fogueira de sonhos.

Feliz Natal à humanidade que não se rende ao atraso de acumular sempre as mesmas dores no costado dos fracos e as mais iluminadas alegrias nas almas de poucos.

Feliz Natal!

Moisés Diniz é professor e deputado estadual do Acre, neto de nordestinos de Riacho do Sangue e índios ashaninkas das margens do Rio Amônia.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Organiza o Natal

Carlos Drummond de Andrade

Alguém observou que cada vez mais o ano se compõe de 10 meses; imperfeitamente embora, o resto é Natal. É possível que, com o tempo, essa divisão se inverta: 10 meses de Natal e 2 meses de ano vulgarmente dito. E não parece absurdo imaginar que, pelo desenvolvimento da linha, e pela melhoria do homem, o ano inteiro se converta em Natal, abolindo-se a era civil, com suas obrigações enfadonhas ou malignas. Será bom.

Então nos amaremos e nos desejaremos felicidades ininterruptamente, de manhã à noite, de uma rua a outra, de continente a continente, de cortina de ferro à cortina de nylon — sem cortinas. Governo e oposição, neutros, super e subdesenvolvidos, marcianos, bichos, plantas entrarão em regime de fraternidade. Os objetos se impregnarão de espírito natalino, e veremos o desenho animado, reino da crueldade, transposto para o reino do amor: a máquina de lavar roupa abraçada ao flamboyant, núpcias da flauta e do ovo, a betoneira com o sagüi ou com o vestido de baile. E o supra-realismo, justificado espiritualmente, será uma chave para o mundo.

Completado o ciclo histórico, os bens serão repartidos por si mesmos entre nossos irmãos, isto é, com todos os viventes e elementos da terra, água, ar e alma. Não haverá mais cartas de cobrança, de descompostura nem de suicídio. O correio só transportará correspondência gentil, de preferência postais de Chagall, em que noivos e burrinhos circulam na atmosfera, pastando flores; toda pintura, inclusive o borrão, estará a serviço do entendimento afetuoso. A crítica de arte se dissolverá jovialmente, a menos que prefira tomar a forma de um sininho cristalino, a badalar sem erudição nem pretensão, celebrando o Advento.

A poesia escrita se identificará com o perfume das moitas antes do amanhecer, despojando-se do uso do som. Para que livros? perguntará um anjo e, sorrindo, mostrará a terra impressa com as tintas do sol e das galáxias, aberta à maneira de um livro.
A música permanecerá a mesma, tal qual Palestrina e Mozart a deixaram; equívocos e divertimentos musicais serão arquivados, sem humilhação para ninguém.

Com economia para os povos desaparecerão suavemente classes armadas e semi-armadas, repartições arrecadadoras, polícia e fiscais de toda espécie. Uma palavra será descoberta no dicionário: paz.
O trabalho deixará de ser imposição para constituir o sentido natural da vida, sob a jurisdição desses incansáveis trabalhadores, que são os lírios do campo. Salário de cada um: a alegria que tiver merecido. Nem juntas de conciliação nem tribunais de justiça, pois tudo estará conciliado na ordem do amor.

Todo mundo se rirá do dinheiro e das arcas que o guardavam, e que passarão a depósito de doces, para visitas. Haverá dois jardins para cada habitante, um exterior, outro interior, comunicando-se por um atalho invisível.

A morte não será procurada nem esquivada, e o homem compreenderá a existência da noite, como já compreendera a da manhã.

O mundo será administrado exclusivamente pelas crianças, e elas farão o que bem entenderem das restantes instituições caducas, a Universidade inclusive.

E será Natal para sempre.

Texto extraído do livro "Cadeira de Balanço", Livraria José Olympio Editora - Rio de Janeiro, 1972, pág. 52.

Xapuri entrega Prêmio Chico Mendes

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O Salão Paroquial da Igreja de São Sebastião, local onde foi velado o corpo de Chico Mendes há 21 anos, recebeu decoração especial para premiar os vencedores deste ano do Prêmio Chico Mendes de Florestania. O governador Binho Marques anunciou que ano que vem a festa de entrega do prêmio ocorrerá no dia 15 de dezembro, dia de nascimento do líder seringueiro, e não no dia 22, dia de sua morte.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

O Chico Mendes que eu vi

Moisés Diniz

Conheci o Bastião, o Zé, o Antônio, todos Mendes. Conheci até outros Chico Mendes! Mas foi o Chico Mendes de Xapuri, no Acre amazônico, que me fez escrever este ensaio. Os outros Mendes e os outros Chicos não conseguiram emergir das águas do anonimato que mata os filhos da classe dos proscritos. Eles ficam encurralados na cerca da sobrevivência!

Acordar com a madrugada, pescar uns peixes miúdos, comê-los com sal e banha na panela, ao alvorecer, agarrar-se aos instrumentos de trabalho, a enxada, a faca de seringa, o terçado, enfezar-se com mutucas, o pium, a ‘ruçara’, cipós-de-fogo, todo tipo de inseto, até inseto que mata, pico-de-jaca, cascavel, olhar para o sol que aquece o sangue, queima e rasga a pele, proferir uma ofensa, arrepender-se, retornar ao casebre, na mesma roupa adentrar a mata, uma espingarda e uma fé manca, uma ‘imbiara’, a janta, dos filhos banguelas, da mulher destruída, na pele, na alma e na esperança, retornar cabisbaixo, um macaco-prego, uma ‘nambu’, meninos alegres, para ver quem ficará com os ossos das mãos e dos pés, fazer brinquedos com ossos, na ausência compulsória do natal urbano, descer ao porto, tomar um banho com pouco sabão, voltar ao casebre, fumar um ‘porronca’, contar um ‘causo’ da mata, que viveu ou ouviu, animar a família, dizer que naquele ano vai dar para tirar saldo do trabalho bruto, comprar um fardo de chita, um sapato, um relógio, uma lanterna, mais sal e açúcar, ‘combustol’, lavar a boca no jirau, espirrar, tossir, mijar no ‘trapicho’, olhar no terreiro o ‘bacurin’, as galinhas, o pato, dar uns farelos ao pequeno guariba que grita na ponta da paxiúba, armar a rede, sacudir, para espantar as aranhas e a maldição, deitar o corpo quebrado, a alma partida, os pés maltratados, o coração amedrontado, rezar um pedaço do terço, que já é um pedaço da oração, benzer-se, agradecer a Deus o dia, a comida, o roçado, o ‘bruguelo’ que nasceu, falar algo à mulher que até hoje ninguém entendeu, descer a mão para as partes secretas, vestidas, cobertas, gemer baixo, esfregar-se, prender a respiração, ejacular, envergonhar-se do corpo desnudo, limpar-se, dormir como um poste, acordar, espreguiçar-se, vestir-se, lavar a boca, cuspir, recomeçar...

A primeira guerra que Chico Mendes venceu foi a guerra da sobrevivência!

A guerra pela sobrevivência é mais longa e árdua que qualquer outra guerra e não deixa outros Chico refletir. Chico Mendes, todavia, cansou-se daquele ritual, acordou a madrugada e os companheiros e os fez parceiros da sua utopia. Utopia de fazer a madrugada radiante, alegre, abundante, transbordando alimento, peixe, carne, arroz, mandioca, feijão, lanterna acesa, pólvora quente, rede limpa, uma cama, orgasmo tranqüilo, porta, dobradiça, menino na escola, igreja, procissão, sapato nos pés, quermesse, leilão, dinheiro no bolso, roçado, legumes, frutas, festa, violão. Chico Mendes tocou as estrelas sem sair do roçado, estampou nos jornais das metrópoles as estradas de seringa, o balde, a ‘poronga’, os varadouros. O defumador acanhado deixou de ser imagem exclusiva dos olhos da mata, da colocação. A anta, o caititu, a sapopema, o tucum, a malária, a morte precoce sob a carga elétrica do ‘puraqué’, a queda do ‘mutá’, as festas religiosas, o linguajar. Chico Mendes fez a floresta, como uma deusa, desfilar nos salões, Onu, Bird, Haia, Wall Street, Financial Times, tudo que a elite criou, Washington Post. As coisas simples do povo da mata caminharam em procissão, solidariedade, divulgação. Chico Mendes fez o milagre de colocar a floresta assombrosa dentro da televisão!

“O seringueiro Chico, Chico Mendes da televisão, virou menino de recado dos gringos, vendedor dos nossos segredos, da nossa soberania”, disse a elite mesozóica, divulgaram os jornais diluvianos! Era o que mais se ouvia das gargantas profanas, daqueles que matam Chico todos os dias!

Quem foi Chico Mendes e o que ele queria?

Não interessa o nome completo, o pai, a mãe, a escola onde estudou, a professora, o seringal, os irmãos, os sonhos de adolescente, as namoradas, o padre que o batizou. De sua individualidade, basta o dia da sua morte, 22 de Dezembro de 1988, quando um jagunço fez explodir o seu peito com um tiro de doze!

Perdão! Preciso fazer mais um registro individual, os dois meninos que Chico Mendes fez fecundar no útero de Ilzamar, sua morena mulher. Sandino e Elenira! Sandino guerreiro, mártir do povo nicaragüense e Elenira guerrilheira, mártir das matas do Araguaia. Chico Mendes os fez quando já visitava os gringos, recebia prêmios da Onu, portanto, é enigmático o seu varadouro, enquanto dialogava com os poderosos, batizava os filhos com os nomes da guerra.

O homem Chico Mendes está sob a terra de Xapuri. A história julgará, todavia, os seus passos, a sua voz, os seus bilhetes, a sua utopia. Deles nos ocuparemos, tentando admirar, tocar e dissecar as suas secretas vontades. Chico Mendes queria flashes, holofotes? Deputado do Acre bastaria! Queria dinheiro, riqueza? Fazendeiro de Xapuri ajudaria!

O que Chico Mendes queria? Além do que Chico Mendes profetizava, lutava, dizia, algo mais imprimia as suas vontades? Como um humilde seringueiro, de linguagem simples, vivendo numa casa modesta conseguiu chamar a atenção do mundo? Que mistério dominava a mensagem de Chico Mendes para que, ao mesmo tempo, provocasse tanto ódio e tanta paixão? Além do senso comum (a luta pela preservação da floresta) há algo mais? Por que outros ecologistas (inclusive, mais destacados que Chico Mendes) não foram ouvidos? Por que o ‘inexpressivo’ Chico Mendes, de Xapuri, teve a sua luta reconhecida em todos os quadrantes da terra?

A argumentação simplista de que Chico Mendes atendia a interesses econômicos e políticos poderosos (internacionalização da Amazônia) se chocará com a constatação de que outros ecologistas notáveis ficaram no anonimato. Isso não significa dizer que os capitalistas que determinam a geopolítica não tenham interesse em controlar a Amazônia e não utilizem determinadas personalidades ou entidades para esse fim. Esse não é o centro deste ensaio! O que queremos é dialogar sobre o mistério que envolve a utopia e a prática de Chico Mendes.
O que de novo apresentava a prática de Chico Mendes? Que métodos de luta utilizava que diferiam de outras táticas?

O Empate! O empate consiste em perfilar, no meio da floresta, homens, mulheres, crianças e anciãos com o objetivo de impedir a sua destruição. Quando juntava dezenas de pessoas e os colocava em frente a um trator, Chico Mendes tinha a consciência do perigo. Um tratorista-jagunço poderia passar por cima (literalmente) daquelas pessoas, incluindo anciãos, mulheres e crianças. Uma árvore poderia cair e matar crianças! Balas endereçadas a ele ou a outras lideranças poderiam atingir os inocentes!

Aqui reside a primeira contradição. Todos eram inocentes! Chico Mendes sabia, aprendera com os animais da floresta, que a luta pela sobrevivência, desde os primórdios envolvera todo o bando, o grupo, a horda. Chico Mendes não precisou estudar biologia! A escola da mata ensinara que as espécies que venceram foram aquelas que ensinaram as crias, desde cedo, a lutar para vencer o ambiente hostil. Por outro lado, Chico Mendes percebera que, desde o animal da floresta ao jagunço sem alma e convicção, havia algo que os unia: a proteção intransigente das crias. Nenhum animal e nenhum homem permitem agressão à sua prole, em especial, às crias indefesas. Chico Mendes apostou alto no humanismo que dorme na alma do mais insensível jagunço. A vida confirmou a sua aposta!

A tática de Chico Mendes foi além. O seringueiro Chico Mendes construiu uma tática intermediária entre o pacifismo e o belicismo. O empate é uma forma de luta nova. Combina o pacifismo da espera, produzindo aliados, com o belicismo do enfrentamento. Não produz o movimento do ataque [que pode obscurecer o apoio logístico], todavia se posta na frente do teatro da guerra. Na verdade, ataca o adversário, mas faz o seu movimento parecer apenas um contra-ataque. Conduz a opinião pública à conclusão de que quem atacou primeiro foi o madeireiro, o latifundiário. Objetivamente, o madeireiro atacou a floresta, não os atores do empate. Chico Mendes, com o seu movimento intermediário, conseguiu convencer que o madeireiro estava atacando os povos da floresta, por isso o empate era um contra-ataque. Os atores do empate estavam, portanto, se tornando árvores, pássaros, raízes, animais, riachos e plantas. Levantavam-se em seu lugar! As mulheres eram a castanheira, a envireira, os cipoais. Os anciãos eram os pássaros, os insetos, as larvas, os animais. Os homens, a sapucaia, a sapopema, o tucum. As crianças eram os riachos, os lagos, as gotas teimosas do orvalho, o ciclo da chuva.

Chico Mendes não deixou de rezar, participar das liturgias do seu povo, fazê-las instrumentos de organização e combate. Chico Mendes, no entanto, anunciou uma outra promessa. A mais simples e mais antiga das profecias: ‘a terra que vocês buscam é aquela que está debaixo de vossos pés!’

Moises Diniz, 40 anos, é neto de índios Ashaninkas, ex Irmão Marista, formado em pedagogia e deputado estadual do PCdoB no Acre. Escreve no blog Ecos Socialistas.

  • Ensaio publicado no portal Vermelho, no dia 19/12/2005.

domingo, 20 de dezembro de 2009

Mais velho

O dia 20 de dezembro é sempre um dia especial para este aprendiz de blogueiro. Não somente porque nesta data vim ao mundo, estando completando hoje minha 38ª volta em torno do sol - como diria meu amigo e colega jornalista Marcos Afonso -, mas também porque, a cerca de 10 dias da virada para um novo ano, sempre me ponho a refletir o passado e a pensar um pouco no futuro.

Nessa caminhada aprendi que nada se constrói de concreto sem que se aplique amor, dedicação e até mesmo uma pitada de inconseqüência na receita dos projetos idealizados, dentro da medida certa, é claro. Já ouvi dizer que até amor demais faz mal. Tudo tem que seguir o eqüilíbrio do universo arquitetado por Deus, o grande responsável por tudo o que somos e conquistamos de bom.

Aproveito a data, especial para mim, para agradecer a todos vocês que a partir de janeiro de 2007 passaram a prestigiar essa modesta página criada e escrita de forma simples, sem procurar demonstrar falso intelectualismo e com o firme propósito de mostrar os fatos e as idéias relacionados ao universo xapuriense e de combater àqueles que se empenham em atrasar o desenvolvimento da nossa terra.

Com o blog conquistei antipatia, recebi ameaças, e-mails ofensivos e caluniosos e colecionei alguns processos na justiça. Inimizades, não considero. Não guardo rancores. Em contrapartida angariei também o carinho e o reconhecimento de muita gente pelos mais diversos lugares. Fiz muitas amizades no Acre, no Brasil e no mundo através da página.

Enfim, desejo a todos os leitores do blog, tanto aos que realmente prestigiam e têm aqui uma fonte de informações confiáveis sobre Xapuri quanto àqueles que não gostam e criticam ao conteúdo e ao autor, mas que não passam um só dia sem acessar a página. Um bom restante de ano a todos, um Feliz Natal e um 2010 cheio de muita paz, saúde, amor e muita sinceridade no coração.

sábado, 19 de dezembro de 2009

Trabalho escravo em Xapuri

No final de novembro, O site agazeta.net informou sobre um flagrante de trabalho escravo em uma fazenda localizada nas proximidades de Xapuri, mas sem divulgar o nome da mesma nem o de seu proprietário. A reportagem a seguir, de Bianca Pyl, do Repórter Brasil, traz à luz os detalhes da história.

Fiscalização liberta trabalhadores de propriedade no Acre

Vítimas viviam há um mês como escravos na Fazenda Jaborandi e aplicavam agrotóxicos para eliminar ervas daninhas do pasto para o gado bovino. Administrada por Alexandre Vilela, a propriedade fica a 30 km de Xapuri (AC)

Por Bianca Pyl

Mesmo sem receber nada, oito trabalhadores juntaram o pouco que tinham para pagar a passagem de ônibus de um deles para que ele fizesse uma denúncia a respeito da grave situação em que viviam. O esforço resultou na libertação de quatro pessoas de condições de trabalho escravo.

A fiscalização foi realizada no final de novembro e contou com a participação do Ministério Público do Trabalho (MPT), da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Acre (SRTE/AC) e da Polícia Federal (PF). As vítimas estavam há um mês na Fazenda Jaborandi e trabalhavam na aplicação de agrotóxicos para eliminar ervas daninhas do pasto. A propriedade fica a 30 km de Xapuri (AC) e pertence à João Miranda Vilela. A área era administrada, porém, pelo filho dele, Alexandre Vilela.

Os trabalhadores foram aliciados em Xapuri (AC) por "gatos" (intermediários na contratação de mão-de-obra) com a promessa de "salário" de R$ 25 por dia. Contudo, até a data da fiscalização, ninguém tinha recebido absolutamente nada, nem pagamentos e nem adiantamentos. Para a procuradora do trabalho Marielle Guerra, que fez parte da comitiva de fiscalização, ficou claro o cerceamento de liberdade, já que as vítimas não tinham condições de ir embora porque não tinham sequer dinheiro para o transporte.

Trabalhadores consumiam água utilizada pelo gado (Fotos: MPT/AC)

O empregador não fornecia nenhum Equipamento de Proteção Individual (EPI) adequado. Segundo Marielle, os empregados receberam só uma máscara cirúrgica vendida em farmácias. "No sol forte, esta máscara derretia e não oferecia nenhuma proteção aos trabalhadores, que corriam risco de contaminação diariamente", adiciona.

O alojamento era uma barraca de palha no meio da mata. "A cozinheira dormia junto com os outros trabalhadores. Não havia privacidade nenhuma", relata a procuradora. No local, não havia instalações sanitárias nem elétricas. Os empregados eram obrigados, portanto, a utilizar arbustos como "banheiro".

A água consumida vinha de um igarapé e também era utilizada pelo gado. Em depoimento, um empregado relatou que coava a água com uma camiseta para beber porque havia larvas e até fezes de animais.

Um dos gatos comprava a comida do próprio patrão e "distribuía" para os trabalhadores. O valor da alimentação seria descontado do pagamento no final da empreitada. "Pelo que apuramos, em um mês, os trabalhadores já deviam R$ 600 para o gato", relata Marielle. A carne era armazenada em um balde, sem condições adequadas de higiene.

O MPT não conseguiu firmar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). Todavia, os trabalhadores receberam as verbas das rescisão do contrato de trabalho. Além das quatro pessoas libertadas, havia mas trabalhadores na Fazenda Jaborandi. Mas os outros, incluindo uma mulher, receberam R$ 100 de um dos "gatos" e foram embora antes da inspeção.

A solidão da árvore

Não existem mais matas às margens da BR-317, mas a imponência de castanheiras preservadas por força da lei, solitárias na imensidão das pastagens, proporcionam aos viajantes belas e tristes imagens como esta da foto acima, captada em junho de 2007 durante viagem a Cobija, capital do departamento de Pando, na Bolívia. Mais recentemente, o poeta Marcus Accyoli fez o mesmo trajeto e escreveu sobre a solidão das castanheiras no seguinte artigo, reproduzido pelo blog Coisas da Vida, do professor Pedro Vicente, ex-professor das Universidades Federais do Acre e do Rio Grande do Norte:

A solidão da árvore

Marcus Accyoli

Durante a Bienal da Floresta, do Livro e do Leitor – realizada no Rio Branco, Acre, pelo escritor Pedro Vicente – refiz uma viagem feita muitas vezes, há muitos anos. Após um frugal café da manhã no Inácio Pálace Hotel, o novo, pois o velho era Inácio Parece Hotel, eu e o poeta Jorge Tufic, a convite de um grande amigo, o boliviano Miguel Ángel Ortiz, saímos de Rio Branco, em direção a Cubija, no Estado de Pando, na Bolívia. As nossas memórias funcionaram de modo diferente: Tufic se pegou com o menino que ele foi no Acre, Miguel, com a sua vida na Bolívia, e eu, com o tempo de um arcaico Rio Branco, que se escondeu por dentro, ou por detrás, do moderno. Assim, chegamos à recente cidade de Capixaba e só no desvio para Xapuri, onde o rio Acre se encontra com o próprio rio Xapuri, é que nossas memórias se encontraram. Visitamos a casa, o Centro Cultural e o túmulo do seringueiro Chico Mendes (que cantei no meu livro – Latinomérica) e logo voltamos à mesma estrada que obrigava Miguel a fazer do seu Honda um cavalo saltando os obstáculos.
A paisagem exibia a devastação sem medida, desde que a borracha cedeu o seu lugar ao gado e o gado à incipiente cana-de-açúcar. Inúmeras castanheiras se aproximavam e se afastavam do acostamento, como uns resquícios da floresta de Hamlet. Cortei o nosso silêncio, sob o silêncio surdo do motor, com uma pergunta: “Quantos metros tem uma castanheira?” Tufic tentou medir, com o olho, enquanto Miguel respondeu: “Cerca de 40 metros”. Algo de doído ligava, em mim, a castanheira da floresta à castanheira da praia, ou amendoeira, quando Miguel prosseguiu: “Como é proibido, por Lei, derrubar castanheiras, elas ficam assim, separadas delas mesmas e da selva”. Observei aquelas árvores solteiras e percebi que algumas de suas ilhas verdes tinham secado. “Parece que elas escaparam, mas estão morrendo, não é, Miguel?” “Pois é, no conjunto elas tem o besouro que, através das plantas e dos cipós, faz a proliferação. Assim, isoladas, o besouro não consegue alcançar a copa e, aos poucos, elas vão morrendo”. “Qual é o tipo de besouro?” “É o mungangá”. “Ah, sei, o cavalo-do-cão, que também reproduz o maracujá rasteiro ou sobre as árvores”. Tufic riu um pouco e disparou: “Esse aí é um cavalo do Nordeste”. Percebi que estava entre um acreano e um boliviano e falei um trecho de cantiga do meu livro Guriatã – um cordel para menino: “Manda música, maestro, / moda má, música má, / mau mestre, muita munganga, / munganguento mugangá”. Tufic aproveitou a deixa e disse algumas cantigas do seu livro: A insônia dos grilos. A partir de então a viagem se tornou um recital.
Depois que atravessamos a ponte e chegamos a Cobija, a cidade também já era outra. “Em Rio Branco, eu só reconheci o Rio Acre, acho que, de Cobija, se Tufic comprar todos os uísques que pretende, só vou reconhecer a alfândega” – eu disse e quase não aconteceu outra coisa, pois, além das bebidas, ele apenas comprou diversas camisas de seda. “O seu caso, Tufic, ao que parece, é de seda e sede” – eu provoquei e ele consertou: “Ao inverso: é de sede e de seda”. Aproveitei o seu “inverso” e, novamente, passamos a dizer algo “in verso” ou “em verso”. Miguel visitou o amigo e ex-governador do Estado de Pando, Felipe, que, com a esposa, Marilu, nos levou à parrilhada. Tufic quase não comeu, em compensação, esgotou, sozinho, mais do que um quarto de uma das garrafas.
De volta, eu disse a Miguel: “Comprei tanto bagulho, que tive de comprar uma mala”. “Pois é, Tufic já leva a dele, como um camelo”. Tufic não respondeu. Voltei-me do banco dianteiro e Miguel percebeu pelo espelho que Tufic sonhava. Tirei a máquina da sacola e fui fotografando aquelas castanheiras tristes, da beira da estrada, como se quisesse que elas não morressem. Para cada foto, Miguel diminuía a velocidade. “Era bom que fosse assim, Miguel, que tudo passasse, ficasse para trás, mas as árvores estão na máquina e na memória”. “Pois é, e o pior é que ficarão mais na memória do que na máquina”. Tufic acordou de repente e perguntou à-toa: “Vocês estão falando de máquina ou de memória?” “Da máquina da memória e da memória da máquina, Tufic” – eu disse, enquanto Miguel desviou de um buraco e Tufic, com a vantagem do tombo, regressou ao seu sono, ou seu sonho, de poeta.

MARCUS ACCIOLY é poeta, professor da UFPE e Presidente do Conselho Estadual de Cultura de Pernambuco. Publicou entre outros livros: Sísifo, Érato, Narciso e Latinomérica. E-mail: marcusaccioly@terra.com.br.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

“Presente de Greco”

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Blogueiro Altino Machado:

“Panetone tão bom quanto o último Bauducco que comprei na Casa dos Cereais, cuja autenticidade cheguei a duvidar devido a escassez de frutas cristalizadas”.

Redação do Ac24horas, ou seja, Roberto Vaz:

“Por curiosidade a equipe de ac24horas resolveu provar um desses produtos e descobriu que ele é seco, tem poucas frutas cristalizadas e a massa é de péssima qualidade. É, na verdade um presente de Greco!”

Minha opinião: Acho que o presente de “greco” foi enviado somente ao Vaz. O que recebi estava saboroso e recheado de frutas cristalizadas. Consultarei a Secretaria de Comunicação sobre a possibilidade de mais uma remessa para a equipe da Rádio Aldeia de Xapuri. Com os calotes que tenho tomado ultimamente não teria mesmo condições de comprar um Bauducco.

Jatene é agraciado, em MG, com o mérito da saúde

Do blog Coluna da Baby Garroux.

Ex-ministro da Saúde nos governos Fernando Collor e Fernando Henrique, o cardiologista Adib Jatene foi o grande homenageado da entregada Medalha do Mérito da Saúde pelo secretário Marcus Pestana.

A medalha foi concedida na última terça-feira (15) a mais de 20 personalidades. Um dos mais renomados cardiologistas do país, Jatene destacou um problema crônico da saúde: a falta de financiamento. “A Saúde no Brasil não pode ficar na discussão do orçamento. É preciso definir recursos permanentes e crescentes para o setor”, defendeu o ex-ministro, criador da extinta CPMF, o “imposto do cheque”.

Nascido em Xapuri (AC), Jatene não escondeu a emoção com a homenagem em Minas - ele viveu adolescência em Uberlândia e iniciou carreira médica em Uberaba, onde foi professor de Anatomia Topográfica da Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro. Aos 80 anos, ele lembrou que acompanha a saúde no Brasil desde 1948, quando iniciou o curso de Medicina na USP, e, diferentemente do que muita gente diz, o ex-ministro garante que o setor no Brasil anda bem. “A pesar da falta de recursos, o SUS tem feito muito”, diz Jatene.

O doutor Adib Domingos Jatene sempre foi um lutador incansável e, como não poderia deixar de ser, dedicou ainda parte do seu tempo no desenvolvimento de 272 trabalhos científicos publicados em revistas indexadas e 133 trabalhos publicados e citados na literatura. Com tantos trabalhos publicados, Jatene hoje é membro de 32 Sociedades Científicas de várias regiões do mundo e recebeu 178 títulos e honrarias de mais de 10 países. E em 1998 foi admitido na Ordem Nacional do Mérito Científico, na classe Grã-Cruz, tendo seu mérito reconhecido.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Fonte do Bosque

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É deplorável o estado da histórica Fonte do Bosque, onde teriam, segundo relatos, matado a sede os soldados-seringueiros de Plácido de Castro e seus cavalos antes da tomada da então Mariscal Sucre, na madrugada de 6 de Agosto de 1902.

Localizada em uma rua atrás da Praça Getúlio Vargas, em Xapuri, a fonte de água cristalina possui valor histórico inestimável. Além da relação com a Revolução Acreana, a vertente abasteceu a sociedade xapuriense durante mais de meio século.

Em 1976, foi inexplicavelmente aterrada pelo então prefeito Ivonaldo Portela, sendo reativada 10 anos depois pelo prefeito Vanderley Viana em seu primeiro mandato, que a tombou como patrimônio histórico e cultural de Xapuri.

Estão ligadas à história da fonte figuras igualmente históricas, como os nordestinos Manoel Bundinha, que abastecia as residências com seu velho jumento, Velho Cruz e seu burrico, Antônio Rodrigues, conhecido como Antônio da Burra, e Manoel Benedito e sua burra Asa Branca, entre outros que viviam da mesma atividade.

Apesar de toda a história que carrega, numa terra onde a maioria das pessoas não valoriza a sua própria memória e cultura, o patrimônio não é tratado da forma merecida. Ainda jorrando seu "líquido precioso", o lugar está semi-abandonado, sem uma estrutura que dignifique a sua importância e que atraia a visitação de turistas. A alguns metros acima, mictórios de bares construídos na praça Getúlio Vargas, ameaçam a qualidade da sua água.

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A atual administração pretende revitalizá-la juntamente com a praça Getúlio Vargas. A História agradece.

Latrocínio

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Artur Ramoile Alves e Silva, 19 anos, neto do fazendeiro Darly Alves da Silva, foi condenado a 50 anos de prisão em regime fechado pela prática de duplo latrocínio – roubo seguido de morte. A sentença foi proferida na última terça-feira, 15, pela titular da 2ª Vara Criminal da Comarca de Rio Branco, juíza Denise Castelo Bonfim. Clique na imagem para ler a reportagem do jornal A Gazeta.

“Ponte da Bolívia”

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Retroescavadeira hidráulica trabalha no local onde será reconstruída a ponte sobre o igarapé Santa Rosa, principal acesso da comunidade do bairro Braga Sobrinho – “Bolívia” - com o centro da cidade.

Acima, moradores remendando a ponte que esteve interditada para carros por vários meses antes de ser desmanchada. Abaixo, o que sobrou dela com o início dos serviços de reconstrução.

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Ao fundo, trabalhadores do Deas – Departamento Estadual de Água e Saneamento – trabalham para restabelecer o fornecimento interrompido pelas obras.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

“A César o que é de César”

Éden Mota

Dias atrás, este blog publicou postagem denominada “Isto é uma Vergonha”, onde ali, como filho e cidadão xapuriense, reclamava eu das condições em que se encontravam as ruas que davam acesso à casa de Chico Mendes.

Ouvi muitos comentários positivos a respeito, uma vez que pelo menos alguém teria bradado quanto à falta de atitude de quem quer se seja. Ouvi também que integrantes da administração municipal ficaram melindrados.

Quero deixar claro que, como cidadão, estou apenas reivindicando aquilo que acredito ser melhor para nossa cidade, não tendo o propósito de denegrir a imagem de qualquer administração.

Ademais, elogios e críticas fazem parte da democracia. O bom administrador não ouve só elogios, deve, principalmente, dar ouvidos às críticas, pois são nelas que solidificamos nossas atitudes e ações.

Desta maneira, da mesma forma que critiquei quanto à situação das ruas que davam acesso à Casa de Chico Mendes, venho aqui, parabenizar o atual prefeito pela brilhante coragem – que os antecessores não tiveram – de retirar da praça de Xapuri construções em cima de bens públicos.

Éden Mota é xapuriense e bacharel em direito.

Tião é candidato a governador

O jornalista Aníbal Diniz, Secretário de Comunicação do governo do Acre e primeiro-suplente do senador Tião Viana (PT), afirma em nota enviada ao jornalista Altino Machado (clique e leia) que a chapa majoritária da Frente Popular do Acre será formada pelo senador Tião Viana (PT) candidato ao governo, Jorge Viana (PT) e Edvaldo Magalhães (PC do B) como candidatos ao Senado.

Machado havia dado destaque, um pouco antes, à nota da coluna Bom Dia, do jornal A Tribuna, que afirmara que Jorge Viana poderia assumir a qualquer instante a candidatura ao governo do Estado pela Frente Popular, em substituição ao senador Tião Viana por conta de um processo no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que envolve Anibal, que não deixou o cargo de secretário de Comunicação no tempo legal para concorrer ao cargo de suplente do Senador.

- Jorge Viana reúne todas as qualidades necessárias para as funções mais elevadas, e já provou isso de sobra com todos os avanços e conquistas que o Acre experimentou durante os oito anos em que esteve sob seu governo. Ele, tanto quanto o governador Binho Marques, entende que é chegado o momento do Acre ser governado pelo senador Tião Viana, que goza de imenso respeito, carinho e admiração junto à maioria dos acreanos e que lidera desde as eleições de 2006, quando ele não pode disputar por ser irmão do então governador, todas as pesquisas de intenção de votos realizadas, afirma Aníbal Diniz na nota.

“Cobrança Pública”

Do blogueiro Joscires Ângelo, que assina o Xapuri News:

“Recebi na manhã de hoje um telefonema de um cidadão xapuriense, preocupado com o desenrolar do caso de assédio sexual ocorrido segundo denúncia do Ministério Público na Sede da Delegacia de Polícia de Xapuri e devidamente noticiado pelo Blog XAPURI AGORA, já que, segundo o autor do telefonema, a morosidade com que o caso vem sendo apurado demonstra que tudo terminará em pizza. Usando as palavras da pessoa que me ligou indago a quem de direito for o caso....

A agilidade com que costumeiramente vemos os casos sendo elucidados e os culpados sendo devidamente encaminhados ao Presídio Estadual, não vale para esse caso também? A mesma truculência vista em muitas ações da Polícia de Xapuri também não vale para esse caso? A Justiça xapuriense ficará calada diante desse fato? Cadê o Ministério Público para cobrar agilidade? Onde estão os Direitos Humanos, tão propagados no Acre? A Política Nacional de Violência contra a mulher será amordaçada nessa lide? Não é o caso dos vereadores, dignos representantes do povo, cobrarem uma resposta condizente com o caso? Será que está havendo jogo de poder por parte de algumas autoridades em proteger pessoas ligadas ao fato? O que aconteceu de fato na Delegacia de Xapuri?

Ou será toda essa história mais um conto xapuriense inventado?

Não quero ser o dono da verdade, até por que não falei nada acerca do ocorrido anteriormente porque acredito que esse tipo de denúncia deve ser muito bem investigada, porém jamais podemos ter previlégios a quem quer que seja. Sou sabedor que devido as últimas ações da Policia Xapuriense contra o banditismo e comportamentos insalubres à comunidade xapuriense, muita gente tem ficado p... da vida, até mesmo por que convenhamos que alguns excessos foram cometidos, porém sinceramente, acredito que esses excessos não foram demasiadamente suficientes para macular o trabalho bem feito, porém não podemos deixar de acreditar que provavelmente alguns cidadãos possam querer prejudicar a imagem da polícia com denúncias dessa estirpe.

Apenas o que quero, e acredito que a pessoa que me ligou também quer, é uma resposta ao fato ocorrido, se é verdade, se não é, quem foi, quem deixou de ser, se já foi arquivado por faltas de provas, ou está cozinhando em banho-maria e por que o está?

Novamente endosso que não estou jogando piadinhas, apenas me entrigou, primeiramente a ligação e depois realmente a calmaria do fato...”.

Nota do blog: Na última tentativa que fiz de ter informações oficiais sobre o caso, não fui recebido pela promotora Diana Soraia Tabalipa Pimentel sob a justificativa de que não havia ainda sido instaurado nenhum procedimento sobre o caso. Não desisti do assunto e pretendo, em breve, trazer à luz detalhes a respeito dessa história, como disse antes, escabrosa que caminha sob um silêncio sepulcral. Conversei, há alguns dias, com o acusado no caso, que contou sua versão dos fatos. Seu nome continua em sigilo porque o mesmo não autorizou que sua identidade fosse divulgada antes que a própria promotora, que recebeu a denúncia, o fizesse isso publicamente.

Dengue

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Agente de Endemias aplica o “Fumacê” – UBV Leve ou Costal, nesse caso – no centro de Xapuri. O número de atendimentos no hospital Epaminondas Jácome nos últimos dias, de pessoas apresentando os sintomas da dengue, causa preocupação na cidade quanto a um surto epidêmico da doença.

Bar em praça vai ao chão

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Um dos bares que foram construídos sobre a praça Getúlio Vargas foi demolido pela prefeitura. Em breve, o departamento jurídico da prefeitura deverá abrir negociação com o “Bebum”, outro estabelecimento erguido sobre o mesmo espaço público. A revitalização da praça pretendida pela atual administração não contemplará a exploração desse tipo de atividade, mas certamente apresentará alternativas de localização para o bar e também para a população, que tem poucas opções na cidade tanto para “lanchar” quanto para bater aquele papo de sexta-feira regado a uma cerveja gelada. E o Bebum é hoje uma dessas poucas opções.

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Chico faria anos hoje

Chico Mendes, se vivo fosse, completaria 65 anos nesta terça-feira.

A seguir, texto retirado da Infopédia:

Activista brasileiro, Francisco Alves Mendes Filho nasceu em 1944, no estado amazónico do Acre, na fronteira brasileira com a Bolívia. Ainda criança de nove anos envereda pela profissão a que já estava destinado à nascença, seringueiro, ou seja, a extrair e tratar a borracha (látex) retirada da hévea brasileira (ou seringa, daí o nome), principal produto do estado e meio de sustento da sua e da maior parte das famílias da região, quase todas oriundas do Nordeste.

Na sua condição social, o seu destino não podia ter sido outro. Todavia, Chico Mendes não deixou de ter uma visão do mundo que se estendia para além do seringal e uma perspectiva do trabalho e seus direitos muito mais alargada que os seus companheiros de profissão. Neste sentido, desde os anos 70 que Chico Mendes mobilizava os seringueiros para preservarem o seu "ganha-pão", a floresta virgem amazónica contra o seu desbaste para criação de espaços abertos para a pecuária extensiva. A resistência assentava num plano simples e eficaz: o impedimento dos desbravamentos através da colocação dos seringueiros e suas famílias entre as moto-serras e as árvores.

Em meados da década de 80, fundou o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri (Acre), abrangendo quase somente trabalhadores da borracha. No ano de 1985, fundou o Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS). Homem tolerante e diplomático, encetou diálogos proveitosos entre os índios e os seringueiros, dois grupos desde sempre avessos mas reconciliados por Chico Mendes, que inspirou mesmo a criação de uma associação cívica denominada de "Povos da Floresta".

Chico Mendes defendia o desenvolvimento racional e equitativo da floresta, considerando não ser preciso considerá-la um santuário intacto se não se avançasse para a sua devastação. Promoveu, neste âmbito, a elaboração de estudos e projectos de reservas para os seringueiros, com infra-estruturas sociais e materiais de apoio às suas famílias, meios de segurança contra os fazendeiros e mecanismos de escoamento e comercialização dos produtos florestais. Para tal, apelou a meios intelectuais e científicos brasileiros e estrangeiros, desde antropólogos a organizações ambientalistas dos EUA e Europa. A sua actividade sindical e, numa esfera mais alargada, de defesa da floresta da Amazónia e seus ecossistemas naturais, bem como dos seus habitantes de várias raças (índios, brancos, mestiços, negros), tornaram Chico mundialmente conhecido, tanto mais que a sua luta colidia com interesses instalados (governamentais, particulares e multinacionais) e prepotentes, apoiados muitas vezes na lei do "senhor da terra". Os fazendeiros, grandes e poderosos latifundiários, com avultadas fortunas e meios paramilitares e de segurança agresivos (os jagunços ) nunca simpatizaram com as iniciativas e reinvindicações de Chico Mendes e seus companheiros, várias vezes os ameaçando e coagindo no sentido de manterem a Amazónia como sempre estivera, à mercê da sua cupidez e desbaste.

A fama de Chico Mendes granjeou-lhe amizades e prémios internacionais, como o Global 500 das Nações Unidas (Londres, 1987) e o Ted Turner´s Better World Society (EUA, 1987). No ano seguinte, participaria ainda na reunião do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BIRD), em Washington, EUA. Para além destas distinções e apelos internacionais, uma miríade de artigos e reportagens nos mais diversos meios de comunicação propagavam o nome e a causa de Chico Mendes por todo o planeta, mobilizando o mundo inteiro para a defesa da Amazónia. Fez inúmeras viagens e empreendeu uma série de reuniões ao mais alto nível, cativando simpatias e apoios. Conseguiu mesmo, na reunião do BIRD, impedir a construção de uma estrada trans-amazónica no Acre que poria em perigo a floresta, os habitantes e as suas actividades produtivas ancestrais, em harmonia com a natureza. Muitos bancos e instituições científicas, ambientalistas ou humanitárias internacionais aplaudiram-no, o mesmo fazendo o Congresso americano. Todavia, no seu Brasil e, mais concretamente, no seu Acre natal, os ódios e juras de morte contra Chico eram cada vez em maior número, com a sua cabeça a prémio entre os fazendeiros, madeireiros ou ganadeiros, embora talvez estes fossem a máscara de forças ainda mais poderosas. Desde há muito, no entanto, que previa a sua morte brutal, consciente dos perigos e ódios que desencadeava na sua luta e os impedimentos de abate florestal.

De facto, às 18 horas e 45 minutos de 22 de Dezembro de 1988, à porta da cozinha da sua casa em Xapuri, Acre, Chico Mendes era assassinado a mando de um fazendeiro, de seu nome Darli Alves da Silva. O executante foi o filho deste, Darci, que disparou à queima-roupa uma espingarda de caça. Morria aquele a quem já apelidaram de "Gandhi dos trópicos", uma personalidade carismática e empreendedora que o Brasil só descobriu verdadeiramente depois da sua morte atroz. A sua consciência ecologista era notável, ainda que de nada lhe tenha valido. Numa mensagem de despedida escrita em 5 de Dezembro de 1988, antevendo o seu fim trágico, feito de forma cobarde e odiosa, escreveu: "Não quero flores no meu enterro, pois sei que vão arrancá-las da floresta. Quero apenas que o meu assassinato sirva para acabar com a impunidade dos jagunços, sob a protecção da Polícia Federal do Acre e que, de 1975 para cá, já mataram mais de 50 pessoas". Acusou uma série de autores de homicídios e "justiças de fazendeiros", ainda que a Polícia Federal não tenha usado tais informações, que acabariam por se provar com a morte de Chico.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Caminhos cruzados

Chico Mendes encontrou Che Guevara no bar

Não, caro leitor, o título acima não é fruto de nenhum delírio ou ressaca mal curada. Pesquisando e realizando entrevistas para um material que foi publicado na revista Fórum, em razão dos vinte anos da morte de Chico Mendes, surgiu uma revelação fantástica: o líder seringueiro encontrou um dos ícones da esquerda mundial em um estabelecimento etílico.

Após ter tido participação decisiva na Revolução Cubana, Che Guevara queria "exportar" o modelo para outros países. Teria mirado a Bolívia como um dos seus alvos mas, com a CIA no seu encalço, escolheu caminhos tortuosos para chegar ao país, daí sua estada no Acre. Não são poucos os acreanos que afirmam terem cruzado com Guevara, que teria abordado algumas pessoas para chegar até a fronteira com o país vizinho. E o encontro com Chico, narrado pelo próprio ao professor Pedro Vicente em história confirmada pelo jornalista Élson Martins, se deu desta forma:

"Naquele momento se falava no Guevara, mas eu não conhecia. Nunca havia visto seu retrato nos jornais, até porque não tinha nem revistas ou jornais no seringal. Tinha ouvido seu nome através da Rádio Central de Moscou, não me recordo bem o ano, creio ter sido nos meados de 65 ou 66, eu estava caminhando do seringal para a cidade. As pessoas costumavam fazer longas caminhadas pela BR-317, na estrada velha, em direção a Brasiléia ou a Xapuri. Passava muita gente. Eu estava cansado e parei no bar, no entroncamento, a 12 quilômetros de Xapuri. Naquele instante chegou um cidadão vindo das bandas de Rio Branco.

Demonstrava ser uma pessoa muito educada, encostou-se no bar e puxou conversa comigo e com outros que estavam próximos. Falou que tinha interesse em conhecer a selva amazônica, principalmente os seringais e a selva boliviana. Indagou se eu era seringueiro, respondi que sim e já há muitos anos. Perguntou se não gostaria de acompanhá-lo até os seringais da Bolívia, pois não tinha costume de caminhar na selva. Precisava de uma pessoa que conhecesse os varadouros e o levasse na direção da fronteira. Dava para identificar que não era brasileiro, misturava um pouco de português com o espanhol.

Ele conduzia uma mochila, falou que tinha jóias e aproveitava a viagem pra vender e sobreviver durante o percurso. Não dispunha de muito dinheiro, mas perguntou quanto eu queria por dia para ir com ele até onde pudesse. Não aceitei o convite. Alguém me disse que era perigoso, podia ser um bandido. Não acreditei, mas não podia ir. Alguns meses depois, em Xapuri, passei diante da delegacia de polícia e um retrato me chamou a atenção. Havia um cartaz, nele anunciava-se um prêmio de 50 milhões de pesos a quem entregasse o terrorista Che Guevara, vivo ou morto. Dizia que Che se encontrava em território boliviano para organizar o terror na região. Fiquei abalado. Lembrei-me que havia visto e conversado com aquela pessoa no entroncamento. Nunca pude imaginar, pensei comigo mesmo, que aquela pessoa fosse um terrorista. Olhei várias vezes a fotografia. Não tive a curiosidade de pegar uma propaganda, um cartaz e guardar comigo.

Tempos depois, ao ler o livro sobre a guerrilha do Che na Bolívia, reafirmei a convicção de que cruzei com ele. Posso afirmar com certeza, era o Che”.

Che entrou na Bolívia como Ramón Benítez, comerciante uruguaio

Já no quarto do Hotel Copacabana, em La Paz, fez esse auto-retrato

9/10/67: Félix Rodríguez, da CIA, posa com Che em sua última foto vivo.

Fonte: Blog Futepoca: Futebol, política e cachaça, em 26 de novembro do ano passado.

domingo, 13 de dezembro de 2009

Morre Alvarino, irmão de Darly Alves

Morreu neste final de semana em Rio Branco, aos 79 anos, o fazendeiro Alvarino Alves da Silva, irmão de Darly Alves, condenado pela justiça como o mandante do assassinato do seringueiro e sindicalista Chico Mendes, cuja morte completará 21 anos no próximo dia 22.

Alvarino foi denunciado por Chico Mendes como um dos responsáveis pelas ameaças à sua vida e pelo assassinato do delegado sindical Ivair Higino, ocorrido no dia 17 de junho de 1988. Mesmo denunciado pelo Ministério Público como um dos matadores de Higino, Alvarino não foi levado a julgamento porque para ele o crime havia prescrevido em razão de sua idade avançada.

Dos três acusados que foram levados a julgamento, dois foram absolvidos: Cícero Tenório Cavalcante e Gentil Alves, filho de Alvarino. Oloci Alves, filho de Darly foi condenado a 9 anos, mas foi beneficiado pela figura jurídica da prescrição retroativa, ou seja, ninguém foi punido pelo assassinato de Ivair Higino.

Quanto ao assassinato de Chico Mendes, a suposta participação de Alvarino Alves nunca ficou comprovada. A foto que ilustra o post é de André Pessoa, da revista Rolling Stone.

sábado, 12 de dezembro de 2009

Visitação

Eu nunca fui a Xapuri. Nunca visitei a casa de Chico Mendes. Sei que ainda está lá a marca de sangue na parede. Eu nunca vi, mas outro dia estive lá sem estar. A casa se parecia àquela em que morei em Rio Branco, pequena, de madeira, simples e aconchegante. Conversamos sobre seringalismo e seringueiras, sobre sindicato e fazendeiros gananciosos. Contei-lhe que meu bisavô materno foi herói da borracha, ele riu. Contei-lhe que meu avô paterno também foi seringueiro. Não perdemos tempo com lamentações sobre partidos, políticos corruptos e assassinos. Falamos sobre coisas simples da Amazônia. Sobre mata, capivaras e passarinhos. Ele me ofereceu uma branquinha, a princípio não aceitei por causa de medicamento, ele insistiu e eu acabei tomando uns goles. Depois de um tempo de prosa ele me repetiu, “é vivo que a gente fortalece essa luta”. Fiz silêncio e pensei: “essa luta nunca morre, e nem você, compadre acreano”.

Texto de Éverton Vidal Azevedo.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Anistia a desmatadores

Além de adiar até 2012 a punição de desmatadores, o presidente Lula decidiu suspender a cobrança de multas aplicadas aos proprietários rurais que respeitarem o limite de corte de vegetação nativa em suas terras, informa reportagem de Marta Salomon para a Folha (íntegra disponível para assinantes do UOL e do jornal). O valor da anistia é estimado em R$ 10 bilhões, similar à despesa, por ano, do Bolsa Família.

Leia também:

Lula planeja ajuda financeira a quem não desmatar

A anistia faz parte do programa Mais Ambiente, resposta de Lula à pressão dos ruralistas. As punições deveriam ter entrado em vigor no ano passado, mas até junho de 2011 não haverá nenhuma punição. A partir daí, irregularidades serão notificadas e, depois, cobradas na forma de multa.

O ministro Carlos Minc (Meio Ambiente) reagiu à anistia aos produtores multados. "Se for isso, vou pedir para mudar, o acordo não era esse, isso vai ter de ser corrigido."

O decreto presidencial que determina a anistia será publicado na edição de hoje do "Diário Oficial da União".

Leia a reportagem completa na Folha desta sexta-feira, que já está nas bancas.

Cobertura d’O Baile

Fiquei devendo a cobertura do baile do Projeto Resgate Cultural, realizado em Xapuri no último dia 5 de dezembro, reunindo os grandes nomes que fizeram a história dos conjuntos musicais da cidade. Por motivos superiores não pude prestigiar o evento, me limitando a publicar algumas fotos, no post anterior, enviadas pela minha amiga Jorleiva, que é sobrinha de Nonato Cruz, uma das feras que estiveram em cena nesse espetáculo. Mas o espaço está aberto a quem queira escrever sobre o baile e contar alguns detalhes dessa noite especial. Disponham do blog.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Denúncia de abuso na delegacia de Xapuri

Emerge da Delegacia de Polícia de Xapuri uma história escabrosa. O Juiz da Vara Criminal da Comarca, Anastácio Lima de Menezes Filho, expediu alvará de soltura em favor de uma presa da justiça, a pedido da promotora Diana Soraia Tabalipa Pimentel, como medida protetiva contra supostos abusos de natureza sexual que a apenada viria sofrendo da parte de um agente civil de nome não divulgado.

Segundo a denúncia feita à Promotoria de Justiça de Xapuri, uma mulher que se encontrava cumprindo pena na delegacia de Xapuri por determinação da Justiça, teria sofrido diversas tentativas de abuso sexual, além de ameaças de ser mandada ao presídio caso delatasse o agressor. Procurada, a promotora Diana Soraia não se dispôs a falar sobre a denúncia por não ter instaurado ainda nenhum procedimento quanto ao caso.

Através de sua assessoria, a promotora informou que estaria consultando o Controle Externo do Ministério Público para definir que medida tomar com relação ao caso. Na delegacia, o delegado Pedro Henrique Resende afirmou que não tinha muitas informações sobre a denúncia e que não sabia a qual dos seus agente a denúncia se refere.

- Você está mais informado do que eu, disse ele.

Apesar dos nomes dos envolvidos no caso não terem sido divulgados à imprensa, foi fácil identificar a suposta vítima. A única mulher que cumpria pena na delegacia de Xapuri era Regiane Santos da Silva, 26, sentenciada junto com seu marido, Valdecir da Silva, o “Sinha”, 20, a 1 ano e 8 meses de prisão depois de serem flagrados pela polícia portando substâncias entorpecentes no mês de dezembro do ano passado.

Sinha foi encaminhado ao presídio e Regiane foi mantida cumprindo a pena na delegacia de Xapuri por determinação do Juiz Anastácio Menezes, de acordo com o delegado Pedro Henrique, onde teria sido vítima dos supostos abusos. O magistrado determinou a soltura de Regiane depois de suspender o cumprimento do restante de sua pena, que ainda tinha alguns meses pela frente.

Rota do tráfico

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Uma patrulha da Polícia Rodoviária Federal composta pelos agentes Getúlio Mário de Azevedo, Francisco Ismael Barbosa e Joneudes Fernandes de Souza Filho fez a apreensão do droga acima no entroncamento da BR-317 com a Estrada da Borracha. São cerca de 1,2 quilos de cocaína, que tinha Rio Branco como destino final, segundo Raimundo Anselmo Leal da Silva, morador da cidade de Brasiléia-Acre. Ele tinha um menor de idade em sua companhia. Ambos estão na delegacia de polícia de Xapuri. Raimundo será transferido para o presídio de Rio Branco, o menor está à disposição do Juizado da Infância e da Juventude.

Que venha o “choque de gestão”

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O funcionalismo municipal de Xapuri recebe o 13º salário nesta sexta-feira, 11. O anúncio da antecipação, que já havia sido feito aqui no blog, também foi ao ar pela TV Xapuri, em entrevista feita por Haroldo Sarkis, da Diretoria de Divulgação Social da prefeitura, com o prefeito Bira Vasconcelos. O salário de dezembro será pago no dia 23.

Na entrevista, o prefeito petista voltou a avaliar como positivo o desempenho da administração Todos por  por Xapuri em 2009, em que pesem as críticas que sua gestão tem recebido de opositores e segmentos da população. “Há uma impaciência por parte das pessoas, mas vamos fazer Xapuri acontecer”, disse ele.

Apesar do otimismo, Bira sabe que o ano que se aproxima deverá ser bem melhor que o que se finda para subir na avaliação da opinião pública. Usando as palavras do jornalista Archibaldo Antunes, em sua ótima coluna política – Prisma – em agazeta.net, “muitos acreditaram que ele daria um choque de gestão no município, o que até agora não aconteceu”.

Confiante em dias melhores num futuro breve, o prefeito anunciou um pacote de 13 ações para este final de ano, entre elas o início da recuperação da rua Dr. Batista de Moraes, onde está uma conhecida e fétida cratera, localizada nas proximidades da Casa de Chico Mendes, patrimônio histórico nacional, e a reconstrução da ponte que liga o bairro da Bolívia ao centro da cidade.

Bira anunciou também um Natal melhor que o passado em Xapuri. A prefeitura está preparando a decoração natalina da cidade e distribuirá mais de 1.500 brinquedos para crianças carentes que estão sendo cadastradas pela Secretaria de Ação Social. Eventos religiosos envolvendo as igrejas locais também estão programados pela prefeitura de Xapuri.

Resta desejar um bom Natal ao prefeito e sua equipe e que em 2010 a chamada “Revolução Silenciosa” defendida por Bira comece a dar seus frutos com geração de emprego e renda e com a construção de uma cidade melhor para se viver, enfim, que venha o tal “choque de gestão” esperado por todos nós. Afinal de contas, o melhor lugar para um xapuriense viver é mesmo Xapuri.

Semana Chico Mendes

Corrida pedestre marca início de vasta programação que relembra ideais de líder seringueiro morto em 1988.

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Golby Pullig – Agência de Notícias do Acre.

As homenagens para lembrar a morte e reavivar os ideais de Chico Mendes começam neste domingo, 13, organizadas pelo Comitê Chico Mendes em parceria com o Governo do Acre, Centro de Trabalhadores da Amazônia (CTA) e Instituto Chico Mendes. A primeira atividade da programação é a Corrida Pedestre que faz parte do calendário esportivo do Acre e terá largada às 17 horas do Palácio do Governo.

Este ano, a programação está voltada para divulgar as experiências desenvolvidas na Reserva Extrativista Chico Mendes e em outras comunidades que desenvolvem projetos de sustentabilidade baseados no conceito de preservação ambiental descrita por Chico Mendes.

Seringueiros e extrativistas serão os protagonistas nos debates que envolvem temas como as cadeias produtivas da castanha e da borracha e a vida dessas populações dentro de reservas florestais. O reflexo do projeto educacional Seringueiro também será relatado pelas crianças e adultos alfabetizados pela iniciativa pioneira.

"Nós queremos mais uma vez levar essas experiências, essas atividades comunitárias que dão certo, para que a sociedade conheça. Nosso objetivo é fortalecer cada vez mais os ideais do Chico, que hoje se espalham por todo o mundo", explica a presidente do Comitê Chico Mendes, Júlia Feitoza.

Xapuri será sede de parte da programação da Semana Chico Mendes, como a entrega do Prêmio Chico Mendes de Florestania, criado para valorizar as práticas comunitárias, projetos, programas e ações que estimulam a construção do modelo de desenvolvimento sustentável, e o lançamento do Cadastro Único para os moradores da Resex Chico Mendes. Por meio do CadÚnico, será possível identificar os moradores da reserva e realizar um levantamento das condições sociais e econômicas dessas famílias.

Chico Mendes foi assassinado na porta de sua casa em 22 de dezembro de 1988. Suas palavras e ações são difundidas ainda hoje como incentivo à criação de medidas de proteção das florestas e de seus moradores e para a promoção de um desenvolvimento econômico e social mais justo e ambientalmente sustentável.

Veja aqui a programação completa da Semana Chico Mendes.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Imagens do descaso

As imagens acima estão no blog Xapuri News, assinado pelo professor-blogueiro Joscires de Oliveira Ângelo em post intitulado “Descaso!!!!”. Mostram como o dinheiro dos xapurienses tem sido jogado fora pelos administradores que têm passado pela prefeitura nas últimas décadas.

Muito oportuna a ideia de postar provas da contumácia do descaso dos maus gestores com o patrimônio público, mas não entendo que as fotos falem por si só, como afirma o blogueiro. Precisa-se esclarecer para os leitores quem são os responsáveis pelo abandono do maquinário no meio da floresta. Dar nome aos bois.

A atual administração evidentemente não está isenta de responsabilidades pelo fato de o problema ter sido herdado de gestão anterior. Cabe explicar o porquê de máquinas tão caras continuarem jogadas assim, ao léu, sendo devoradas pelo mato nas margens de ramais que deveriam estar recuperando. E já que Joscires não teve tempo para perguntar, farei isso eu mesmo.

Recordo que quando essas máquinas chegaram a Xapuri foram recebidas com intenso foguetório a la Sucupira de Odorico Paraguaçú e carreata maior do que a que se costuma organizar no dia de São Cristovão (25 de julho), protetor dos motoristas. Alguns meses depois elas já estavam no estado que as imagens denunciam.

 

Na foto acima, em abril de 2007, o então prefeito Vanderley Viana mostrava a situação do maquinário recebido de seu antecessor, Júlio Barbosa de Aquino. Abaixo, o estado em que ele, Vanderley, deixou de herança uma “pá mecânica” para o seu sucessor, Bira Vasconcelos. Esse espaço vazio entre as rodas é o lugar onde deveria estar o motor da máquina, que simplesmente desapareceu.

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Abaixo, o estado em que encontrei, numa oficina mecânica em Epitaciolândia, em março deste ano, exposto ao sol e chuva, um ônibus da Secretaria Municipal de Educação de Xapuri, responsável pelo transporte de alunos da zona rural do município para estudar na cidade. Em determinado período, as crianças chegaram a ser transportadas em Toyotas. Chegavam à escola imundas, de tanta poeira.

O veículo havia sido completamente depenado e depois abandonado no local, onde permanecia ao relento por quase dois anos. Segundo informações do proprietário da oficina, as peças tinham sido retiradas do ônibus com autorização do ex-prefeito Vanderley Viana.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Nivaldo

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Nivaldo José da Silva, peão de boiadeiro, 74 anos de idade, 62 de profissão. Uma das figuras anônimas do cotidiano xapuriense que vou estar mostrando aqui no blog. Gente simples e trabalhadora que simboliza a força e a determinação do povo da nossa terra.

Comentário postado pelo xapuriense João Maciel:

"Prezado Raimari,

"Parabéns pela iniciativa. As pessoas qualificadas como "anônimas" são igualmente importantes e protagonistas da história de Xapuri e devem ser reconhecidas como tal. A exemplo do que tem sido falado em seu blog por alguns colaboradores acho que o destino do município está nas mãos de sua população, ou seja, na capacidade dessas pessoas anônimas se mobilizarem. Há em Xapuri um número muito grande de pessoas que nunca tiveram papel de destaque político ou econômico, mas que são a própria imagem da cidade.

Abraço".

Tá faltando heróis?

Blog do Otanon

Os “zeróis” acreanos “forjados” na ponta da caneta

Leio no blog de Xapuri http://raimari.blogspot.com artigo assinado por professor Nazareno intitulado Os “zeróis” de Rondônia. Ele fala de pessoas ilustres como Abraão Lincoln, George Washington, Martin Luther King e até no pervertido John Kennedy, como exemplos de pessoas que devem permanecer na História dos seus lugares como verdadeiros heróis.

Na realidade, Nazareno quer “tirar sarro” dos rondonienses por estes não terem heróis e tem a maior “cara de pau” em dizer: “Até o Acre tem os seus heróis. Chico Mendes, que esteve à frente de sua realidade ao defender o meio ambiente quando ninguém..., Marina Silva, amiga e contemporânea do "amigo da floresta"..., para finalmente dizer que Rondônia não tem heróis, nunca teve e nem também ninguém que tenha se destacado sequer a nível nacional ou mesmo regional.

Segundo ele, “Carlos Ghosn, presidente da Nissan, nascido em Porto Velho em 1954, se naturalizou francês. José Maurício Bustani, porto-velhense nascido em 1945, talvez nunca mais tenha vindo aqui depois que foi embora e se formou pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, a PUC, em 1967. Quem conhece alguma declaração deles falando sobre sua terra de origem? A maioria dos coronéis que governaram isto aqui morreu nos seus estados de origem sem ao menos lembrar a existência das “Terras Karipunas”.

Professor Nazareno, eu já havia escrito algo sobre os heróis acreanos mas descartei o assunto. Achei deselegante um filho de Rondônia “desdenhar” dos heróis alheios. Mas como o senhor puxou o assunto:...

Vamos lá... Chico Mendes é ou foi herói de quem? Quando e Onde? Qual foram suas ações em favor das florestas pelo mundo, exceto as estradas de seringa do Seringal Cachoeira? Uma briga fisiológica em favor das seringueiras que lhes garantiam sustento... Ou o senhor acredita que ele tinha noção de ecologia, meu ambiente, eco sistema, efeito estufa e aquecimento global? Era apenas um trabalhador preocupado com a própria vida. Depois de morto, foi vendido como produto de exportação do Acre na condição herói. Ponto!

O senhor sabia que a família de outro “herói” acreano Coronel Mâncio Lima entrou na justiça contra um historiador da UFAC para este não publicar as barbaridades que ela fazia contra os índios? Desde quando promover genocídio durante as “correrias” em aldeias repletas de índios dormindo, é heroísmo?

E a nossa senadora Marina Silva (eu votei nela) ambientalista ultra radical que deixou o Ministério do Meio Ambiente após perder as lutas solos que travou contra os transgênicos, o avanço da cana de açúcar na Amazônia e a construção das hidrelétricas de Rondônia e há quem diga ter sido ela responsável por anos de atraso nas obras de construção da BR-364 entre Rio Branco e Cruzeiro do Sul, ao exigir apresentação do EIA/RIMA. E que teria seu “dedo” para o fracasso na instalação de uma usina de álcool no Acre? É uma pessoa honrada, de idéias próprias e que as defende até as últimas conseqüências. Mas daí a ser heroína...

O senhor sabia que o maior herói acreano, Plácido de Castro, foi contratado por comerciantes de Manaus e Belém para comandar uma guerrilha contra o exército boliviano no Acre. Quem luta por dinheiro é herói ou mercenário?

Quantos livros o senhor já leu de outro herói acreano Elias Antunes que ganhou até estátua na “calçada da fama” do Acre como poeta e escritor? Historiadores da Globo o citaram na novela “De Galvez a Chico Mendes” (de Glória Peres), como um pinguço desocupado que vivia a escrever versinho para ganhar cachaça “de graça” nos bares da época? Enfim, a lista de heróis no Acre é extensa.

Tenho o maior respeito pelo povo acreano. Meus filhos e netos são todos acreanos e não sou acreano nato por força do acaso. Quando meus pais se mudaram para Rondônia (onde nasci) minha mãe estava no oitavo mês de minha gestação.

Me considerado por tanto, um legítimo acreano. Mas não posso ficar calado quando o assunto é falta de herói. Acredito ser melhor não tê-los, que fabricá-los para se dizer que tem.

Para os rondonienses, o único herói conhecido é o marechal do exército e engenheiro topográfico Candido Mariano da Silva Rondôn, enviado do Rio de Janeiro pelo presidente da república para comandar a construção da rede de telégrafo entre Porto Velho e Cuiabá. Dizem que era um militar linha dura e cruel. Teria mando matar muitos que não concordavam com sua veneração pelos índios, que dizimavam os trabalhadores. Pelo seu pioneirismo de ações em lugares inóspitos, também foi homenageado com o nome do Projeto Rondôn. O senhor conhece?

O certo é professor Nazareno, que o nome “Rondônia” é em homenagem ao marechal Rondon, herói rondoniense tão desmerecido em minha opinião, quanto à totalidade dos “heróis acreanos”.

domingo, 6 de dezembro de 2009

Os “zeróis” de Rondônia

Professor Nazareno

Quase todos os países e nações do mundo baseiam sua história na bravura e nos feitos de alguns de seus filhos ilustres. Difícil não entender por que os franceses têm na figura do ditador Napoleão Bonaparte um de seus ícones, os ingleses homenagearem o almirante Nelson, além dos seus reis e rainhas e os norte-americanos verem em Abraão Lincoln, George Washington, Martin Luther King e até no pervertido John Kennedy exemplos de pessoas que devem permanecer na História dos seus lugares como verdadeiros heróis. São pessoas que, de uma forma ou outra, marcaram o seu tempo. Imprimiram a sua forte presença nos manuais de História ensinados nas escolas.

Até o Acre tem os seus heróis. Chico Mendes, que esteve à frente de sua realidade ao defender o meio ambiente quando ninguém tinha consciência ou coragem para fazê-lo, é endeusado no mundo inteiro como um defensor da floresta e herói do seu tempo. O humilde seringueiro de Xapuri foi reconhecido nos cinco continentes e recebeu, além do reconhecimento, muitos prêmios internacionais. Marina Silva, amiga e contemporânea do "amigo da floresta", apesar de ter pertencido durante muito tempo ao PT, o “partido dos mensaleiros”, atualmente desponta no Brasil com uma liderança política capaz de fazer frente aos mais conhecidos e renomados políticos do país.

Rondônia não tem heróis, nunca teve e nem também ninguém que tenha se destacado sequer a nível nacional ou mesmo regional. Carlos Ghosn, presidente da Nissan, nascido em Porto Velho em 1954, se naturalizou francês. José Maurício Bustani, porto-velhense nascido em 1945, talvez nunca mais tenha vindo aqui depois que foi embora e se formou pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, a PUC, em 1967. Quem conhece alguma declaração deles falando sobre sua terra de origem? A maioria dos coronéis que governaram isto aqui morreu nos seus estados de origem sem ao menos lembrar da existência das “Terras Karipunas”.

Além de não ter heróis, Rondônia quase não tem história também. Os rondonienses demoraram mais de 29 anos para entender que a data da criação do seu próprio Estado coincidia com a lei que transformara o antigo Território Federal de Rondônia em Estado. Todo mundo sabe, há muito tempo, que a data em que nascemos não é a data em que fomos registrados. Óbvio isto. O dia 04 de janeiro (tem até bairros na capital com este nome) foi comemorado inutilmente durante todo este tempo pelo povo daqui como se fosse tudo normal, com direito até a feriado estadual e comemorações. Devemos rasgar todos os livros de História Regional ou reescrevê-los?

Foi preciso um acreano da gema, Odacir Soares, propor a mudança de datas ao governo local. Guardadas as devidas proporções, é a mesma coisa que dizer a um brasileiro nato, e que tenha estudado o suficiente, que 22 de abril de 1500 é a data da Inconfidência Mineira. “Os grandes incentivadores e defensores da cultura local”, assim como os historiadores da região também não perceberam isto, ou não se interessaram? Não tiveram visão suficiente para entender “o difícil e complicado” jogo de datas que sempre homenageia os vencedores em detrimento dos vencidos. Será que estamos precisando mesmo de heróis?

*É professor em Porto Velho.