quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Devaneios sobre Xapuri

Carlos Estevão Ferreira Castelo

Antes mesmo de explicar o porquê da utilização da expressão devaneios utilizada no título deste post, devo alertar a todos que decidirem dedicar parte de seus preciosos tempos para a leitura do mesmo (de preferência até o final), que não tenho intenção nenhuma de me candidatar a nada. Principalmente ao glorioso cargo de Prefeito Municipal de Xapuri. Faço essa afirmação logo na partida com o claro objetivo de evitar ruídos e comentários desnecessários, mesmo sabendo que irão acontecer.

Informo ainda que as propostas aqui apresentadas (provavelmente apresentarei mais em outros escritos que produzirei nesse espaço democrático) são simplesmente DEVANEIOS. Devaneios sobre o município onde nasci e residi por cerca de 30 anos - de 1966 até o ano da graça de 1996.

São devaneios (agora explicando o termo), pois as reflexões destacadas não são contra ou a favor de nada e/ou ninguém. Devaneios também porque não pretendo ensinar nada, nem apresentar verdades absolutas sobre qualquer coisa. Por isso mesmo, procurei falar de cada um deles sem se prender a regras preestabelecidas, apenas deixando fluir o pensamento, sem censuras ou amaras. Por isso, peço que entendam cada devaneio como uma conversa comigo. Afinal estamos conversando mesmo.

E se alguém se interessar pelos devaneios, podem utilizar sem pedir licença.

DEVANEIO 1 – UM ANO DE FLORES.

Um ano todo plantando flores em Xapuri. Flores que atingiriam em cheio a autoestima da população, que anda um tato quanto baixa. Eu plantaria flores em toda a cidade, durante um ano inteiro. Plantaria “mermo”.

Canteiros e mais canteiros de flores de cores variadas. Faria, inclusive, um belo portal na entrada da cidade. Na chegada em Xapuri, os carros passariam por dois canteiros floridos de um lado e outro da pista.

Também faria uma “rua coberta”, como a que existe em Gramado/RS. Talvez escolhesse a rua entre o “Grupo Escolar Plácido de Castro” e a quadra da rodoviária. Uma “rua coberta” com “trepadeiras e flores”. Com a rua pronta, iniciaria um processo de relocalização dos vários empreendimentos comerciais de alimentos que já existem espalhados desorganizadamente pela cidade (sorveterias, pizzarias, bares, etc.). Como a faturamento deles com certeza aumentaria, a resistência não seria tão grande. Teríamos uma importante atração turística. Aí quem sabe o turista de final de semana passasse a pensar assim: “Vou a Cobija/BO comprar baboseiras, mas antes vou entrar em Xapuri para umas fotos e almoçar na “rua coberta”.

Dinheiro não precisaria tanto, pois existe “pé de flor” que nasce quando se enfia um pedaço do galho da planta na terra. Sementes também não custam tal caro assim. O que seria vital mesmo nesse processo seria uma boa equipe de jardineiros capacitados para colaborar na tarefa. Mas isso também não seria difícil construir. Eu utilizaria os próprios quadros da Prefeitura onde deve ter gente ociosa e disposta a trabalhar. A capacitação da “galera” poderia ser realizada através de parceria com alguma Prefeitura brasileira com experiência ou quem sabe através do Parque Zoobotânico da UFAC.

Uma alternativa seria bancar o “floriamento” (não sei se a palavra existe) do Município com dinheiro proveniente de projetos do SEBRAE, que possui tanta grana que não sabe como e onde gastar. Para isso, seria necessário certa habilidade e iniciativa da Prefeitura (do Prefeito, é claro), que construiria o projeto durante um dos diversos Planos Plurianuais - PPA´s - do SEBRAE, com o “auxilio luxuoso” do Governo Estadual que é quem realmente manda naquela Instituição.

DEVANEIO 2 – PLANTANDO PROJETOS.

Eu também escreveria projetos e mais projetos. E um pouco mais de projetos. Para “arrancar” o dinheiro existente em vários Ministérios (Das Cidades, Turismo, etc.). Edital é que não falta. Iniciaria os projetos seis meses após as flores serem plantadas. Para isso, solicitaria ajuda da “Associação dos Prefeitos”, do “Escritório Técnico do Governo Estadual”, e, principalmente, da Universidade Federal do Acre, onde existem diversos professores com habilidades e competências no tema e, também, alunos de economia ansiosos para aprenderem, na prática, como fazer um bom Projeto Público. Faria um convênio com a UFAC (eles entrariam com o pessoal e a Prefeitura com a Estadia e alimentação). Batata.

Nesse processo a famosa “bancada de Brasília” seria acionada para abrir as portas dos ministérios. E ai deles se “fizessem corpo mole”. Talvez um convênio com a UNINORTE também pudesse ser viabilizado para construção dos planos. Inclusive, a feitura dos projetos poderia ser viabilizada financeiramente por instituições privadas. O Banco Itaú, por exemplo, financiaria cursos e iniciativas nesse sentido. Os jovens estudantes xapurienses necessariamente estariam envolvidos.

DEVANEIO 3 – CONSTRUINDO A VISÃO DE FUTURO

Com as flores crescendo, antes de iniciar a construção dos projetos eu chamaria a população para construir a VISÃO DE FUTURO DO MUNICÍPIO. Não é possível planejar se não se sabe onde chegar. Então, seria preciso definir o ponto de chegada, o norte. Como Xapuri gostaria de ser vista daqui a uns 20, 30, 50 anos? O processo aconteceria alí na “Praça da Igreja”, na rua “mermo”. Talvez pela noite, para o sol não esquentar o “minhocário” da população. Também para permitir a participação dos que trabalham duro duramente o dia. Essa visão seria decisiva. No início, a participação seria tímida, quase inexistente, mas com os primeiros resultados aparecendo a coisa mudaria com certeza.

DEVANEIO 4 – RECONSTRUÇÃO DAS RUAS

Não tem como escapar, a cidade precisa de reconstrução quase que total de sua infra. Então, um dos projetos, não sei se um dos principais, seria o de reconstrução da infraestrutura urbana. Ruas principalmente. Todas as transversais e principais precisariam de uma “cara nova”. Poderia ser com revestimento asfáltico ou outro material. Esse desafio exigiria muito esforço e ação/iniciativa do Prefeito e da população. Mas nada impossível. O Governo Estadual seria decisivo no processo. Viagens e mais viagens para Brasília precisariam ser feitas, utilização de emendas parlamentares (se possível), etc. O extremo seria a população fechar a BR-317, alí no entroncamento. Eu seria favorável a fazer um barulho tremendo se o Governo não colaborasse (Federal e Estadual). Mas isso não seria necessário. Quando os “caras” percebessem a cidade planejando, se mobilizando, percebesse um Prefeito com iniciativa fazendo as coisas diferentes logo se mobilizariam para fazer suas partes. Acho que com três ou quatro anos teríamos as ruas todas recuperadas. Com as flores é claro.

O que o Governo gastou para duplicar a BR-317 do Quinari até o Posto Policial onde, vez por outra, o “baculejo” nos traficantes de cigarros da Bolívia acontece, daria para asfaltar toda Xapuri. Porque não, então.

DEVANEIO 5 – CRIANDO ATRAÇÕES

Como não existem muitas saídas econômicas, Xapuri precisaria dedicar-se ao turismo. É isso o que me parece. Entretanto, seria a construção da visão de futuro citada antes que nortearia. Eu particularmente penso que Xapuri deveria manter sua pecuária (que já está estruturada, mas não gera empregos e a renda fica concentrada nas mãos dos fazendeiros). Também manter, ou se possível aumentar, os atuais níveis da extração de látex e castanha. O látex continuaria abastecendo a NATEX e gerando alguma renda para os extrativistas. Madeira manejada e crédito de carbono sou definitivamente contra, mas ninguém é obrigado a concordar comigo.

No caso das alternativas para a população “seringueira”, que vive nas Reservas e PAE`s, meus devaneios estão mais, digamos, elaborados, em minha tese (quem desejar conhece-los melhor é só ler a pesquisa).

Sigamos: para Xapuri se transforma em “cidade turística” seria então preciso criar atrações (hoje quase inexistentes). Observo que já teríamos a “rua coberta” e as flores.

Eu colocaria um teleférico cruzando o Rio Acre alí na rua Major Salinas. Faria um restaurante em cima do morro que se “avista” do outro lado do rio. O teleférico, simples, ligaria a rua da Major, berço do samba e dos bambas xapurienses, até o restaurante no alto do morro. Choveria de turistas no final de semana para visitar a atração. R$ 30 reais seria o passeio sobre o rio. Bingo. Nada com o um bom projeto, “nemermo”?.

No Brasil existem centenas de cidades com esse tipo de atração. Que com certeza cederia suas experiências para Xapuri. Desculpem amigos, mas eu sempre creio que o impossível é não fazer.

Em junho eu potencializaria os festejos do “Santo da Floresta”: São João do Guarani. Organizaria a comunidade do Guarani em torno dos festejos. De modo que todos ganhassem. Se os evangélicos de lá permitissem, é claro. Acho que permitiriam sim, pois a maioria é adepta da famigerada “teoria da prosperidade”. Mas o ponto central seria uma espécie de trenzinho (sem trilhos – um ônibus adaptado), que transportaria os romeiros e turistas até o local da festa (uma semana de festejos por lá). É claro que uma bandinha de forró tocaria em todo o percurso animando os visitantes. O “trenzinho do forró de Xapuri”. Já vi isso no nordeste e até no trem que leva os turistas até o cristo redentor, no Rio de Janeiro. Juvenal e sua turma agradeceriam muito.

O “vinte de janeiro” seria um pouco diferente do que acontece hoje. Afinal essa é nossa única (talvez) atual “vantagem comparativa turística”. Eu não concordo com os usos e os abusos do nome de Chico Mendes. Então, de cara, transformaria a procissão em um espetáculo (de fé, e de espetáculo mesmo), como Canela/RS e Gramado/RS fazem com o “Natal Luz”.

A procissão iniciaria 17 horas. E chegaria na Igreja São Sebastião à noite. Alí da esquina da rua major salinas até a igreja tochas de fogo estariam acessas, de um lado e outro da rua, iluminando os caminhos. O som seria de primeira qualidade, por todo o trajeto (qual a dificuldade de fazer isso mesmo?). A sonorização é importantíssima para emocionar os romeiros e pagadores de promessas, como eu. Cantores afinados poderiam colaborar. Eu disse afinados.

Na saída do santo, um corredor de crianças jogando flores ou mesmo papel picado nos caminhantes. Da igreja até a casa da dona Nadir. Cordas poderiam separar os pagadores de promessas para destacar melhor. Devaneios, devaneios.

Durante os 10 dias de novenas atrações diversas aconteceriam na cidade. Tudo previamente planejado e divulgado nos meios de comunicação, principalmente em Rio Branco. Shows musicais, recitais, alvoradas, queima de fogos. Eu criaria inclusive a “taça São Sebastião”. Um torneio de futebol envolvendo as equipes profissionais de Rio Branco, que sempre estão em preparação para a “Copa do Brasil” nesse período. Estadia e alimentação para as equipes seriam o suficiente. Claro que times de Xapuri poderiam e deveriam participar. Tudo bancado pela inciativa privada, através de parcerias bem construídas. Nada como um bom planejamento e certa dose de iniciativa.

Os tradicionais marreteiros seriam organizados em local adequado. Com custos bancados por eles mesmos. E não seria permitido que carros estacionassem nas ruas onde a procissão fosse passar. Falando em carros, eu cobraria R$ 10 reais, como taxa turística, devidamente aprovada na Câmara Municipal, de cada carro que entrasse na cidade para os festejos e cuja placa não fosse de Xapuri. Afinal, os turistas também provocam “externalidades negativas” (sujeira, etc.). Claro que no início não seria uma taxa obrigatória, para não assustar. Primeiro se organizaria a “bagunça boa” atual, depois a taxa seria implantada. Várias cidades fazem isso hoje no Brasil. Em Bombinhas/SC, cobra-se R$ 30,00 reais por carro dos visitantes, pessoas que chegam em busca das famosas praias. Ônibus por lá paga R$ 10,00. Mas isso é um processo de construção.

No final da procissão, depois da benção, uma queima de fogos de 10 minutos. Show.

Aproveitando a janela de oportunidade gerada pelo Governo do Acre, que não realiza mais o carnaval da capital no “Arena da Floresta”, eu criaria o melhor carnaval do interior em Xapuri. Claro com atrações diferentes e sem seguir o padrão atual da maioria das cidades. No Nordeste vi uma cidade do tamanho de Xapuri triplicar sua população com turistas com um tal de “carnaval do mela-mela”. Uma espécie de racho, com brincantes se lambuzando de farinha de trigo. Simples assim.

Devaneios, devaneios...

Carlos Estevão Ferreira Castelo é doutor em História Social pela Universidade de São Paulo (USP) e professor da UFAC. Publicou este posto na página Xapuri: memórias e histórias, do também xapuriense Sérgio Roberto Gomes de Souza.

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