sábado, 14 de março de 2015

OS CÍNICOS DA HORA

O cinismo foi uma corrente filosófica fundada por Antístenes, um discípulo de Sócrates, que viveu mais ou menos 400 anos antes de Cristo vir ao mundo. O mais famoso dos cínicos se chamava Diógenes de Sínope, um sujeito que ficava dentro de um tonel ou vaso funerário, e que durante o dia vagueava com uma lanterna acesa a procurar por homens virtuosos.

Uma das histórias mais famosas de Diógenes é a de que certo dia, quando tomava banho de sol, chegou inesperadamente o todo poderoso imperador romano Alexandre Magno dizendo-lhe: “Pede-me o que quiseres”. Ao que o cínico serenamente respondeu: “Desejo apenas que te afastes do meu sol e não me faças sombras.”

A resposta bem ilustra o pensamento cínico. Diógenes não desejava nada a mais do que o que tinha à sua disposição e estava feliz assim. Queria apenas que seu sol fosse desbloqueado. Assim, o objetivo essencial dos cínicos era a conquista da virtude moral, que somente seria obtida eliminando-se da vontade todo o supérfluo, tudo aquilo que fosse exterior.

Nos tempos modernos, o termo cínico se refere àquelas pessoas desavergonhadas, impudentes, que desdenham dos escrúpulos alheios, que se mostram atrevidas ou descaradas ao seguir seus impulsos ou interesses. Segundo o jornalista, crítico e filólogo americano H.L. Mencken, o cínico moderno é o homem que quando cheira uma flor, olha ao redor procurando o caixão do defunto.

Os parágrafos acima são baseados numa crônica de Rubem Fonseca, que já postei aqui no blog há algum tempo. Retornei a ela empurrado pelo comportamento de alguns personagens da vida xapuriense, que em seus discursos abusam do cinismo na sua acepção moderna e em suas práticas se distanciam anos-luz do sentido primordial do termo, que é sinônimo de virtude e de humildade.

A cara de pau de alguns sujeitos nos mostra que homens como Diógenes já não existem, e aqueles a quem procurava com sua lamparina acesa à luz do sol estão cada cada vez mais difíceis de se encontrar. No lugar deles estão os indivíduos cuja alma foi corroída pela indecência a ponto de levá-los a envergonhar a mais despudorada das criaturas. As estripulias desses seres ignóbeis são capazes de render uma obra literária digna do Prêmio Jabuti.

O pior de tudo é que essas mesmas criaturas são tão estúpidas ao ponto de muitas vezes acreditarem piamente serem tal qual o próprio Alexandre Magno, o todo poderoso imperador romano: tudo podem e qualquer coisa fazem acontecer. Impunemente. Precisam aprender muito com o velho Diógenes, o cínico de Sínope, que apenas desejava continuar a receber, serena e humildemente, a sua valiosa luz do sol.

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