terça-feira, 10 de novembro de 2015

A SEXTA-FEIRA 13 E O WT1190F

terra_WT1190F

As informações sobre um pedaço de sucata espacial chamado WT1190F, que viaja neste momento em direção à terra e que deverá entrar na nossa atmosfera na próxima sexta-feira, 13, às 4h19, no horário de Brasília, me fizeram reeditar esse texto, escrito no ano de 2011, quando o satélite artificial norte-americano UARS também despencou lá das alturas, relembrando um episódio parecido, quando a estação espacial Skylab – colocada em órbita pelos EUA na década de 1970 - reentrou na atmosfera terrestre causando em vários lugares do mundo ataques de temor e sensacionalismo.

Na então pacata Xapuri não foi diferente. Como naquela época o único veículo de informação de massa por essas bandas era o bom e velho rádio, e mesmo assim nem todo mundo que o ouvia compreendia bem o que escutava, as notícias sobre a iminente queda da Skylab causaram uma onda de horror na população que temia desde de ser atingida por um pedaço do lixo espacial até à possibilidade de o evento significar o fim do mundo.

A Skylab se desintegrou na entrada na atmosfera no ano de 1979, espalhando pedaços de sua estrutura sobre o Oceano Índico e a Austrália, mas no início dos anos de 1980, havia ainda quem espalhasse por Xapuri a medonha informação de que a estação espacial desabaria a qualquer momento sobre as nossas cabeças, podendo destruir toda a cidade, senão o Acre ou o Brasil inteiro. No entanto, alguns bebuns, certamente os únicos céticos dessa apocalíptica previsão, não perderam a oportunidade e batizaram de Skylab o bar do senhor Domingos Beleza, localizado onde hoje funciona o açougue do seu filho Reginaldo, ou simplesmente “Régi”.

Menino ainda, aos 10 ou 11 anos de idade, eu não tinha a menor noção de que o espaço seria uma espécie de terreno baldio repleto de lixo tecnológico ali abandonado pelas chamadas superpotências, mas levava a história da queda daquela coisa terrível muito a sério e, confesso, me borrava de medo quando ouvia falar no assunto.   

Mas, depois de mais crescido, descobri que naqueles tempos em que a Skylab esteve no céu, estivemos expostos a perigos bem maiores e mais graves que ser atingido por um pedaço de lata espacial ambulante. Vivíamos, no mundo, a temida Guerra Fria, com a ameaça de uma hecatombe nuclear, e, no Brasil, uma sangrenta ditadura militar que dava fim a milhares de vidas e solapava direitos políticos e humanos.

No mesmo ano em que a Skylab despencou, o Brasil começou a viver o advento da abertura política, através da Lei de Anistia, promulgada pelo então presidente João Figueiredo, que beneficiava 4.650 pessoas entre cassados, banidos, exilados ou simplesmente destituídos dos seus empregos. Um pouco mais tarde, o Muro de Berlim foi ao chão como marco fundamental do fim da Guerra Fria, consolidado mais adiante com o gradual desmantelamento da antiga União Soviética e com os acordos pelo desarmamento mundial (com relação a armas atômicas) que tornaram o mundo “menos perigoso”, por assim dizer.

Trazendo para o contexto local, pouco depois da queda da Skylab o Acre começou a viver a “revolução” que, a partir do assassinato de Wilson Pinheiro, em Brasiléia, no ano de 1980, e passando pelo semelhante destino de Chico Mendes, em Xapuri, em 1988, resultou nas transformações políticas e sociais que o estado antes dominado pela pistolagem no campo e pelo crime organizado na cidade passou a experimentar.

Tenho a opinião de que o que venha a cair do céu nos dias atuais, vai se espatifar sobre um mundo bem melhor que o da velha Skylab, a despeito de o ser humano ainda padecer de infinitos problemas que se negam a ser equacionados por quem conduz os destinos do planeta. E aí estão as graves questões da miséria e da fome, da intolerância religiosa, da xenofobia, da homofobia e da ambição econômica que geram guerras, além da corrupção que resulta em outras tantas mazelas que afligem o ser humano.

Mas, como insisto em me negar ao pessimismo, opto por continuar acreditando que, mais do que a possibilidade de cair sobre as nossas cabeças nesta sexta-feira 13, o tal WT1190F possa marcar o início de uma nova fase de mudanças positivas para o mundo de hoje, em todos os aspectos, mas principalmente naqueles que afetem de maneira direta a qualidade de vida dos seres humanos independentemente do lugar onde vivam.

E como é impossível prever o que pode vir a acontecer nesse planeta em que os escândalos de corrupção extrapolaram a esfera político-administrativa, não ficando fora disso sequer o Vaticano, para invadir até mesmo o campo esportivo, e onde a convivência entre o homem e o seu semelhante, assim como a sua relação com o seu próprio meio ambiente estão sempre prestes a entrar em colapso, que pelo menos continuemos, os povos que gozam desses privilégios, a usufruir da liberdade e da democracia, mesmo que esses valores tão fundamentais ao ser humano nem sempre sejam absolutos.

E ainda quanto ao WT1190F, não é preciso pânico nem preocupação. O mais provável é que o objeto se desintegre ao entrar em contato com a atmosfera - e se ainda sobrar algum remanescente, cairá no Oceano Índico a cerca de 65 km da costa do Sri Lanka.

Nenhum comentário: